A Europa (e a União Europeia) têm sido fustigadas por uma onda de extrema-direita, por vezes empolada sabe-se lá com que intenções, demonstrando preocupação legítima a todos os democratas e defensores da liberdade, pelo protagonismo que têm, por aquele que lhe querem dar e pelo exercício de poder autocrático onde o detêm.
Nas recentes eleições europeias, o maior grupo político foi o PPE (centro-direita), seguidos pelo grupo S&D (socialistas e democratas), mas continua a dar-se maior relevo à subida da extrema-direita (e pouco relevo à descida, como aconteceu em Portugal), fazendo-se da anedota do Joãozinho (“é preciso é publicidade”) um padrão que quer condicionar as pessoas, apresentando a ascensão da extrema-direita como inevitável, esquecendo a queda, retrato da História (como no III Reich).
No Reino Unido, após 14 anos de instabilidade conservadora, o povo fartou-se da dança das cadeiras, das promessas e da perda de qualidade de vida e deu a vitória esmagadora ao Partido Trabalhista (centro-esquerda) e a Keir Starmer, advogado de direitos humanos, com 411 de 650 deputados, massacrando os conservadores (que tiveram 121 deputados). Mas o que sobressai nas notícias (pasme-se) são os 71 deputados liberais e os 4 (!) deputados de Nigel Farage, da extrema-direita, apesar do aumento de votos percentual efectivo.
Se na política externa o apoio à Ucrânia é inquestionável, o reconhecimento do estado palestiniano pelo Reino Unido pode criar novo élan para terminar com o genocídio em curso na faixa de Gaza e mesmo na Cisjordânia, perpetrado pelo regime político israelita, e para a libertação dos prisioneiros civis israelitas pelo Hamas.
Internamente, no Reino Unido, o progresso e a justiça social podem ressurgir, com a gestão dos serviços públicos sobrecarregados, incluindo a redução de listas de espera em saúde, o abandono dos cortes na despesa pública, a proximidade com a UE em novos acordos independentemente do Brexit, a melhoria do custo de vida e dos direitos dos trabalhadores, e o fim do plano de imigração.
Tudo sem aumentar o imposto sobre o rendimento, mas sem compromisso quanto às mais-valias, com impostos sobre as escolas privadas e taxas extraordinárias sobre as empresas de energia para financiar as energias limpas, e uma empresa pública energética que descarbonizará até 2030.
O crescimento económico, reformando as leis do planeamento e com nova estratégia industrial, a criação de um fundo de riqueza nacional com 8,6 mil milhões de euros para ajudar a transição para emissões líquidas zero.
Franceses responderam
Em França, a extrema-direita (adepta do regime russo) apressou-se a proclamar a sua vitória na primeira volta, não prevendo que o centro direita e a coligação de esquerda pudessem entender-se, numa verdadeira frente republicana, de forma a impedir a destruição da democracia em França, a conseguir estabilizar a UE, e a salvar da morte a Ucrânia.
Esta estratégia de sucesso faz lembrar quando em 2002, a esquerda votou em Chirac (centro-direita) contra Le Pen, e em Portugal, em 1986, quando votou Soares (esquerda moderada) contra Freitas.
Os franceses responderam, retirando a proclamada maioria absoluta à extrema-direita, e dando um voto de confiança à coligação de esquerda Nova Frente Popular (França insubmissa, socialistas e ecologistas predominantes) que venceu as eleições, pelo que deve governar, com a responsabilidade histórica que agora detém, sem prejuízo de obtenção de entendimento pontual alargado de regime democrático, com programa coerente para as expectativas e direitos dos franceses.
O controlo do custo de vida, a justiça social, a ecologia, as migrações e os direitos humanos deverão ser os pontos-chave da governabilidade do Governo das forças de esquerda, que procure consensos para fortalecer a democracia republicana e para combater o populismo e o radicalismo.
Vive la France! Liberdade, Igualdade, Fraternidade!
(*) Médico e vereador do PS na Câmara de Coimbra