Coimbra  27 de Setembro de 2023 | Director: Lino Vinhal

Semanário no Papel - Diário Online

 

Diniz Freitas

O sentido da Jornada Mundial da Juventude

4 de Agosto 2023

1. As profecias das Cassandras agnósticas e ateias da modernidade e da pós-modernidade, que antecipavam o fim da religião, esboroaram-se. Pelo contrário, a religião está viva e nunca se conseguirá arrancar Deus do coração do ser humano. Faz parte de todas as culturas e civilizações, sem excepção, a crença num ente superior, criador de tudo o que existe, e numa outra vida que continua a terrena. O ser humano não se resigna à ideia da extinção definitiva e do «absurdo existencialista», de que estamos neste mundo por obra de um acaso ou de uma casualidade fortuita e incompreensível. Não se resigna à aceitação passiva da ausência de sentido, mas procura alternativas, entre as quais se continua a afirmar a esperança alicerçada na fé da Ressurreição. Quanto mais encarniçado é o ataque dos livre-pensadores à religião, mais esta efloresce. Ao contrário do que propalam, nem a cultura nem a ciência conseguem demonstrar a não existência de Deus. Ficou célebre a frase de Einstein: «o homem encontra Deus atrás de cada porta que a ciência consegue abrir». A existência de mentes brilhantes que acreditam, é uma das perplexidades do ateu.

2. O homem necessita de Deus. Não foi só a ideia da morte e da extinção física que manteve a transcendência acesa ao longo da história da humanidade. O homem sente convictamente que a justiça total não é deste mundo. Acredita na existência de uma instância suprema, não terrena, onde se reparem as injustiças e crueldades de que é vítima, apesar dos significativos avanços na administração da justiça ao longo dos tempos. Por outro lado, se um dia houvesse evidência científica inequívoca de que Deus não existe, a barbárie dominaria a humanidade porque o homem não é fiável. O homem necessita da lei divina, bem mais que das leis humanas, para viver decentemente em sociedade.

3. A Jornada Mundial da Juventude é mais um glorioso e memorável evento em busca de Deus. É, simultaneamente, uma peregrinação, uma festa da juventude, uma expressão da Igreja universal e um momento forte de evangelização do mundo juvenil. Apresenta-se como um convite a uma geração determinada em construir um mundo mais justo e solidário. Que procuram estes jovens de todo o mundo? O que os move e inquieta? Muito simplesmente, buscam o lugar certo na vida. Ou seja, aquele espaço onde é possível abranger as coordenadas seminais da existência e sobre elas reflectir: a origem, o futuro, a altura e a profundidade. A memória do passado convoca-nos a meditar sobre o que fomos e o que fizemos, se soubemos ser dignos da graça da vida e da herança recebida do nosso passado; o futuro, desafia-nos a encará-lo com responsabilidade, criatividade, ousadia e esperança, à luz da altura e do esplendor do que nos transcende, nos convoca e nos provoca a dar uma resposta pessoal: a consciência, os outros, a lei, Deus. A profundidade é a quarta coordenada da vida. Solicita o empenho numa frequente reflexão da intimidade, uma imersão em nós, em busca do sentido da existência e da verdade da insignificância e da caducidade da vida.

4. Este milhão de jovens de todo o mundo, de todos os credos, de todas as cores, de todas as ideologias que nos vêm visitar, buscam o lugar certo das suas vidas, que envolve a sagração da dignidade e da singularidade do ser humano, o fulgor da nobreza de espírito, o esplendor da verdade, o lucilar da aurora da fraternidade e do amor universal, o refrigério para o sofrimento. Por outro lado, vêm dizer-nos que recusam a melopeia de heresias e de mitologias que conduzem à paganização e cafrealização da humanidade, que repudiam a narcose do espírito, a coisificação da vida e a deificação de ícones e de ícaros voláteis, e se insurreccionam contra a profanação de valores perenes e seminais. E que buscam o sentido profundo da vida para um dia se encontrarem com Deus. Que esta juventude galharda seja benvinda e bem acolhida neste memorável encontro, e que, conjuntamente com a nossa juventude, transmitam a todo o mundo uma lição inesquecível de vida, de paz, de esperança e de confiança que frutifique em abundância.

(*) Professor Catedrático jubilado da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra