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Mário Frota

Política de consumidores: austera, apagada e vil tristeza no Programa do Governo

14 de Abril 2022

Do pretenso Programa de Governo que o Parlamento votou:

“…

A política de consumidores deve ocupar um espaço decisivo na recuperação económica, a nível nacional e a nível europeu.

Deste modo, dar-se-á também seguimento à ‘Nova Agenda [Europeia] do Consumidor’, cujas conclusões foram aprovadas no âmbito da Presidência Portuguesa do Conselho da União Europeia, com enfoque na transição gémea (verde e digital), na cooperação e nos consumidores mais vulneráveis.

Nesse sentido, o Governo propõe-se a:

– Instituir o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor e o Portal do Consumidor, numa lógica de balcão único, aprofundando e articulando ferramentas e mecanismos, existentes e a criar, por forma a reforçar a notoriedade dos direitos dos consumidores e das diferentes respostas para o seu esclarecimento e eventual resolução de conflitos;

– Definir o Estatuto do Consumidor Vulnerável, o qual contemplará um conjunto de critérios e respectivos direitos correspondentes a esta condição;

– Criar a Comissão das Cláusulas Contratuais Gerais, de modo a prevenir o uso de cláusulas contratuais gerais abusivas e dar visibilidade adicional aos prestadores de bens e serviços que incluem cláusulas contratuais declaradas judicialmente como abusivas nos seus contratos de adesão;

– Rever o Código da Publicidade, definindo mecanismos para limitar o contacto de teor comercial com consumidores à sua expressa declaração de disponibilidade nesse sentido, assim como prevenir e punir as técnicas agressivas e inapropriadas de vendas e publicidade;

Rever o regime jurídico das acções colectivas, para protecção dos interesses colectivos dos consumidores;

– Transmitir aos consumidores o maior conjunto de informação possível sobre a
composição dos produtos agro-alimentares, a sua origem, bem como o impacto ambiental da sua produção, estimulando a adopção de hábitos de vida saudáveis;

– Definir e difundir, em cooperação com as associações de produtores e as associações de consumidores, um Índice de Reparabilidade de Produtos, prosseguindo a adopção de instrumentos que permitam ao consumidor obter informação e compará-la, no que à vida útil dos produtos diz respeito;

– Garantir a dinamização da Rede de Apoio ao Consumidor Endividado, com o intuito de assegurar uma resposta de acompanhamento próxima, ágil e permanente em casos de sobreendividamento;

– Avaliar o quadro regulatório das comissões bancárias, assegurando os princípios da transparência ao consumidor e da proporcionalidade face aos serviços efectivamente prestados e continuando, simultaneamente, a assegurar a inexistência de comissões associadas ao levantamento de dinheiro e outros serviços disponibilizados nas Caixas Multibanco;

– Dar continuidade ao reforço dos recursos humanos e materiais da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE), prevendo o alargamento do seu mapa de pessoal, no sentido de garantir a protecção dos consumidores e a sã e leal concorrência, e atendendo aos desafios e oportunidades da transição digital, designadamente implementando o sistema de tramitação electrónica das contra-ordenações económicas;

– Acompanhar e aprofundar o Livro de Reclamações, hoje disponível nos formatos físico, electrónico e móvel, como instrumento crucial da política pública de defesa do consumidor, assegurando que o mesmo constitui uma base para a indemnização e não apenas para aplicação de eventual coima;

– Criar condições para o alargamento e modernização da rede de centros de arbitragem de consumo, designadamente no que concerne à sua presença territorial e através da criação de uma plataforma digital para resolução alternativa de litígios;

Permitir que as entidades reguladoras determinem, mediante injunção, a restauração da situação anterior à prática da infracção;

– Apostar na promoção de iniciativas de informação, sensibilização e capacitação, dirigidas sobretudo aos consumidores mais vulneráveis e com especial enfoque em domínios que carecem de maior divulgação;

– Continuar a fomentar a cooperação a nível europeu e internacional, factor cada vez mais relevante para a protecção dos consumidores, nomeadamente no âmbito das compras online.

Estes os pontos de uma desconchavada e insignificante política de consumidores que o Governo se propõe “executar”…

Na próxima edição, a crítica a esta “mão cheia de nada e outra de coisa nenhuma”…

(*) Presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO