Um estudo conduzido por investigadores da Escola Superior de Educação de Coimbra, do Instituto Politécnico de Coimbra, alerta para o impacto crescente das redes sociais na forma como os jovens portugueses vivem a política. Os resultados apontam para um cenário preocupante: a arquitectura das plataformas digitais parece reforçar divisões e fragilizar princípios essenciais de uma sociedade democrática.
A investigação, realizada entre 26 de Fevereiro e 5 de Março de 2024, envolveu 130 jovens portugueses, com idades entre 18 e 21 anos, todos utilizadores de pelo menos uma rede social e primeiros-votantes nas eleições legislativas de 10 de Março. Embora exploratório e de pequena escala, o estudo permitiu identificar padrões significativos sobre polarização e atitudes políticas.
Entre os participantes com tendências populistas, 27% revelaram maior propensão para expressar polarização afectiva em comparação com aqueles de posições mais moderadas. Em termos absolutos, quase metade dos jovens populistas inquiridos (48,1%) manifestou hostilidade emocional face a quem pensa politicamente de forma diferente, contra 37,9% entre os moderados. Este antagonismo identitário, sublinham os investigadores, vai além da simples divergência de opiniões e mina a possibilidade de diálogo e compromisso.
O estudo mostra ainda que a adesão a discursos de direita radical, como a contestação da “ideologia de género”, se associa a níveis mais elevados de antagonismo. Entre os jovens que subscrevem estas narrativas, 24,6% apresentaram sinais de polarização, contra 17,8% entre os que as rejeitam. Segundo os autores, estes dados indicam que o populismo de exclusão e confronto reforça divisões e fragiliza a coesão democrática.
Redes sociais e efeito na polarização
Os investigadores analisaram também o papel específico das plataformas digitais. Entre os utilizadores do X (antigo Twitter), 27,6% foram classificados como polarizados, enquanto no Instagram a proporção é de 20%. Embora a diferença possa parecer modesta, traduz um aumento de 38% no risco de polarização associado ao X, uma rede marcada pelo confronto público e pela rapidez nas reacções. Já o Instagram, mais visual e identitário, gera um ambiente menos propício ao conflito aberto.
“Estamos perante um fenómeno que vai muito além do ecossistema digital”, sublinha Gil Baptista Ferreira, investigador principal do projecto. “Os jovens eleitores já não são apenas influenciados por partidos e candidatos, mas também por algoritmos que favorecem a divisão e dificultam o diálogo e a coesão social. Este estudo deve ser entendido como um alerta para educadores, decisores políticos e para a sociedade em geral”.
“A polarização digital está a moldar a forma como os jovens encaram a política e os seus pares. Se não for compreendida e mitigada, pode comprometer os fundamentos do debate democrático em Portugal”, acrescenta Lourenço Silva Ferreira, co-autor da investigação.
Literacia mediática como ferramenta de mitigação
Os investigadores defendem a necessidade de investir em programas de literacia mediática que ensinem os jovens a interpretar criticamente os conteúdos online, bem como em medidas que promovam maior transparência algorítmica, reduzindo a formação de bolhas digitais.
Apesar das limitações metodológicas, trata-se de um estudo exploratório, com amostragem de conveniência e não representativo da população jovem portuguesa, os resultados oferecem pistas relevantes sobre como populismo, redes sociais e juventude se cruzam num momento político marcado por fragmentação e desconfiança. Em Portugal, como no resto da Europa, a forma como os mais jovens consomem informação e constroem identidade política representa um desafio crescente para a vitalidade da democracia.