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Portugal: um país de “salários mínimos”

12 de Abril 2025 Jornal Campeão: Portugal: um país de “salários mínimos”

No mais recente estudo do economista Eugénio Rosa, a que o “Campeão das Províncias” teve acesso, conclui-se que, em 2024, o salário mínimo nacional já representava 64% da remuneração base média e 84% da remuneração mediana, o que indica que “o esmagamento dos salários dos trabalhadores com qualificações médias e elevadas continua”, com “consequências dramáticas para o crescimento económico e desenvolvimento do País”, lê-se no documento.

Recorrendo a dados oficiais, o economista analisa a percentagem que o salário mínimo nacional representa em relação à remuneração base média, à remuneração mediana e ao rendimento mediano, mostrando que, de ano para ano, “os valores destes últimos estão cada vez mais próximos do salário mínimo nacional”.

Eugénio Rosa é peremptório: “apesar das contínuas declarações dos sucessivos Governos e dos patrões privados que os trabalhadores com qualificações médias e elevadas são fundamentais para o crescimento económico e o desenvolvimento do País e que, por isso, é urgente tomar medidas para os reter, evitando a enorme emigração dos mais qualificados (muitos dos cerca 50.000 que abandonam todos os anos Portugal), o certo é que, na prática, Governos e Patrões nada fazem de concreto para assegurar remunerações e condições dignas a esses trabalhadores, pois só assim é que será possível inverter esta situação”.

A prova disso, afiança, “é que tanto a remuneração média base como a remuneração mediana (aquela em que metade dos trabalhadores recebem remunerações inferiores a esse valor, e a outra metade recebe remunerações superiores a esse mesmo valor) estão cada vez mais próximas do salário mínimo”. Os dados analisados (Quadro 1), do ministério do Trabalho e do Instituto Nacional de Estatística (INE) “provam isso”, garante o economista.

Aproximação de salários médio e mínimo agrava-se

Eugénio Rosa recorda, neste estudo, que “há mais de três anos, chamamos pela primeira vez a atenção para o facto de Portugal se estar a transformar num ‘país de salários mínimos’, pois o salário médio estava cada vez mais próximo do salário mínimo nacional”.

“E apesar de a comunicação social ter, por diversas vezes, chamado a atenção para esse facto, e dos sucessivos Governos afirmarem que estavam empenhados em mudar essa situação, o certo é que nada mudou, e a situação até agravou como revelam os dados dos quadros de pessoal divulgados pelo ministério do Trabalho”, lamenta.

Suportado nos dados (Quadro 1, de pessoal das empresas de 2012 a 2023 que enviam obrigatoriamente ao ministério do Trabalho), o economista afirma que “a remuneração base média dos trabalhadores está cada vez mais próxima do salário mínimo nacional pois, entre 2012 e 2025, este aumentará 79,4% e aquela subirá 48,5%. Por outro lado, entre 2012 e 2024, o salário mínimo, em percentagem de remuneração base média, aumentou de 53% para 63,2% daquela”.

“A subida considerada na remuneração base média em 2024 foi de 6,4%, que é a estimativa oficial. E, em 2025, deverá subir novamente, agora para 64%, apesar de termos considerado para cálculo da remuneração média um aumento igual ao que, na Concertação Social, foi aprovada pelo Governo, Patrões e UGT (4,7%), pois, o aumento no salário mínimo nacional foi de 6,1%”, explica. Quanto ao aumento do salário médio em 2025, de 4,7%, “provavelmente não será atingido, já que ele não é obrigatório para o sector privado, e o aumento da remuneração média da Administração Pública, decidida pelo próprio Governo, foi apenas de 2,2% em 2025, o que é um incentivo para que os Patrões privados façam o mesmo, e o aumento aprovado pela administração de Paulo Macedo na Caixa Geral de Depósitos (CGD), foi apenas de 2,1%, apesar de ter lucros de 1735 milhões de euros, pois resultaram da sobre-exploração dos trabalhadores, depositantes e clientes, que depois foi seguido por toda a banca privada”, analisa Eugénio Rosa. E acrescenta: “é assim que Governos e patrões incentivam a emigração dos mais qualificados”.

“Atentado nacional”

Para se perceber esta aproximação entre remunerações, o economista Eugénio Rosa contextualiza o conceito: “a remuneração mediana é aquela em que metade dos trabalhadores auferem remunerações base inferiores a esse valor, e a outra metade de trabalho recebem remunerações base mensais superiores à da mediana”. O Quadro 2, construído com dados dos quadros de pessoal do período 2012 a 2022 do ministério do Trabalho e do INE (para os restantes anos utilizou-se os aumentos percentuais das remunerações anteriores), mostra o que se verificou em relação à remuneração mediana e ao rendimento mediano no que respeita ao salário mínimo nacional. Como revelam os dados do Quadro 2, “tanto a remuneração mediana (dados do ministério do Trabalho) como o rendimento mediano (dados do INE) estão cada vez mais próximos do salário mínimo nacional. Este, em 2022, correspondia a 86,4% da remuneração mediana, segundo o ministério do Trabalho, e a 83,5% do rendimento mediano, segundo o INE”, detalha o economista. Estima-se que esta situação se tenha agravado em 2023 e 2024, respectivamente, para 88,5% e 85,3% e prevê-se que continue a agravar-se.

“Com esta política de rendimentos, de manutenção e generalização de baixíssimos rendimentos para trabalhadores e para a maioria da população, é impossível um crescimento económico sustentado e elevado e desenvolver o País. Esta política só pode promover a emigração dos trabalhadores mais qualificados e na idade mais produtiva, indo criar riqueza em outros países. É um verdadeiro atentado nacional praticado por Governos e Patrões”, acusa.

O estudo comparativo do Banco de Portugal

O Banco Portugal publicou, no Boletim Económico de Março de 2025, intitulado ‘Políticas em análise’, um estudo sobre o salário mínimo nacional. Embora para Eugénio Rosa, o documento “contenha erros (remuneração média versus remuneração mediana), contém informação “importante que interessa” reter, e que Eugénio Rosa incluiu no seu estudo.

Assim, salienta o economista, segundo a análise do Banco de Portugal, a percentagem de trabalhadores abrangidos pelo salário mínimo nacional aumentou, entre 2015 e 2022, de 18% para 22,8% (+4,8 pontos percentuais), ou seja, passou de 878.600 para 1.112.600, mais 234.300. “Actualmente, com um salário mínimo de 870 euros, a percentagem de trabalhadores abrangidos deverá estar muito próxima de 30%, o que corresponde a cerca de 1,5 milhões trabalhadores a receberem apenas o salário mínimo nacional (líquido, deduzindo 11% para Segurança Social, restam apenas 774,3 euros)”, afirma.

Segundo o documento, “a percentagem de novos contratos celebrados com salário base igual ao salário mínimo era de 45,3% com trabalhadores com o ensino básico ou menos; de 35,2% com trabalhadores do ensino secundário, de 8,3% com trabalhadores com bacharelato/licenciatura, e de 2,9% com trabalhadores com mestrado. Por nacionalidades, 43% dos novos contratos com salário base igual ao salário mínimo eram com trabalhadores de nacionalidade estrangeira, que comparava com 29%, no caso de trabalhadores nacionais”.

Outra conclusão importante diz respeito à duração do tempo em que os trabalhadores que entram no mercado de trabalho com o salário mínimo e se mantêm com o mesmo valor. “E a conclusão a que o estudo chegou é que, entre 2016 e 2021, dos trabalhadores que entraram no mercado de trabalho, recebendo apenas o salário mínimo nacional, 13% continuaram a receber um salário igual ao salário mínimo nacional passados seis anos, quando nos períodos 2002 e 2008 e 2009-2015 era apenas 4%. Actualmente, deve ser muito superior, previsivelmente mais do dobro”, conclui Eugénio Rosa.

Texto: Ana Clara (Jornalista do “Campeão” em Lisboa)

Publicado na edição em papel do Campeão das Províncias de 19 de Abril de 2025