Aos 60 anos, e depois de uma vida dedicada ao serviço militar na GNR, o agora Tenente-Coronel Vítor Rodrigues regressou à Figueira da Foz, onde serviu de 1999 a 2011, para o que imaginava ser uma reforma tranquila, na casa que adquiriu recentemente, com a mulher, na Avenida do Brasil, mas o convite para encabeçar a lista do Partido Socialista (PS) às próximas eleições autárquicas, colocou-o perante “a possibilidade de servir” a terra que adoptou como sua, e não teve “como dizer não” ao que considerou “um imperativo cívico”.
Campeão das Províncias [CP]: Não é natural da Figueira da Foz, mas escolheu vir morar para cá quando se reformasse. Porquê?
Vítor Rodrigues [VR]: Estive na Figueira da Foz, como comandante da Brigada Fiscal da GNR, entre 1999 e 2011, e a Figueira marcou-me de forma indelével, fui muito feliz aqui, tanto profissional, como pessoal, como civicamente. Fiz coisas muito interessantes e amigos de quem, depois, nunca me afastei. Foi realmente um período muito rico e muito cheio da minha vida.
[CP]: Depois de 2011, ruma a Itália, depois Lisboa, ainda Viseu, novamente Lisboa, sempre em cargos de relevo e absorventes… nunca perdeu o contacto com a Figueira da Foz?
[VR]: Não, e a Andreia até sabe disso, fomo-nos encontrando ao longo dos anos, nas férias, porque eu fiz sempre questão de vir cá passar férias, fins-de-semana… E mantive sempre um grande grupo de amigos que aqui construí, para além de me manter a par das notícias da Figueira, lendo os jornais locais e regionais. Foi mesmo uma ligação que nunca perdi e por isso é que, com o aproximar da reforma, e como por feliz coincidência, a minha mulher, que é italiana, também se apaixonou pela Figueira da Foz, decidimos comprar casa aqui. Ainda não está pronta, mas já faltou mais.
[CP]: Mas veio com a intenção de se envolver mais cívica ou politicamente?
[VR]: Não, não tinha qualquer intenção. Fui abordado/convidado para ser cabeça-de-lista do PS pela Raquel Ferreira (presidente da Concelhia do PS da Figueira da Foz) e fui surpreendido por esse convite, não estava de todo no meu horizonte. Mas, apesar de muitas pessoas julgarem que eu seria mais próximo da Direita, a verdade é que, como militar, vivi toda a vida num estrito apartidarismo. Mas somos humanos, temos valores, e os meus sempre foram os do humanismo, solidariedade e proximidade às pessoas, ideais que, a meu ver, me aproximam mais do PS. Mas vou manter-me como independente.
[CP]: Preocupa-o ir correr contra Santana Lopes?
[VR]: Não me candidato contra ninguém, mas com e pelos figueirenses, e sobretudo com um projecto que pretende ser uma alternativa ao que a Figueira tem actualmente. E este projecto, que é naturalmente meu e do PS, é de dar voz a quem não tem e apoio a quem precisa, de forma a satisfazer as necessidades das pessoas e fazer mais felizes os munícipes.
[CP]: Fala em ouvir as pessoas. Sente que isso não acontece agora?
[VR]: O Município não pode ser apalaçado e fechado, pelo contrário tem de ser aberto e plural. Do presidente ao funcionário do escalão mais baixo, todos têm de perceber que estão para servir os cidadãos, e não o contrário. A cidade precisa de uma estratégia de acordo com os tempos actuais, as realidades e as necessidades actuais, que leve em conta os aspectos sociais e urbanísticos, a revolução tecnológica, desenvolvendo práticas e políticas que levem as pessoas a acreditar que são importantes, porque são realmente o mais importante.
[CP]: Já vamos ter um candidato presidencial com passado militar, parece-lhe que esse enquadramento nacional o pode beneficiar?
[VR]: Não, as coisas são distintas. Concorrer a um acto eleitoral é um direito que temos comos cidadãos, temos passado fora da política, sim, e não escondo que isso pode ser uma mais-valia, porque a carreira militar é uma escola de vida, tem liderança, visão, disciplina, somos trabalhados e preparados para lidar com situações difíceis com responsabilidade e em proximidade. Mas esta missão é diferente, trata-se de resolver problemas às pessoas, e queremos uma campanha não do ‘eu’ mas do ‘nós’, sem culto de personalidade. Trazer este input é importante, para a política não ser esta redoma de vidro, em que os políticos se colocam na posição de rei. Eu não quero isso, tive sempre a felicidade de ser timoneiro de projectos relevantes, e sei o valor do trabalho em equipa.
[CP]: Falou em estratégia, o que pressupõe prioridades. Quais são as suas? E, já agora, se vencer, isso implica acabar com os projectos iniciados pelo actual presidente?
[VR]: O que me preocupa são os problemas de uma população envelhecida, são as realidades distintas a que temos de dar respostas diferenciadas: agricultura e pesca, indústria, serviços e turismo, sustentabilidade, tecnologia e ecologia, uma Figueira da Foz realmente do século XXI. Mas não, quero olhar e gerir para o futuro, e quem não reconhece o passado não está preparado para gerir o futuro. Aguiar de Carvalho, Joaquim de Sousa, Duarte Silva, João Ataíde, Carlos Monteiro, Santana Lopes, todos eles, quero crer, fizeram o que acharam melhor nos respectivos mandatos. O que está feito, está feito, e todos terão feito coisas positivas, há que aproveitar e continuar, agora, não numa dinâmica de ‘hoje tenho uma ideia, faço uma pista, amanhã tenho outra, faço outra coisa qualquer’… Temos de ter projectos consequentes, lógicos, saber o que implicam em termos de gestão financeira no futuro, tratar o erário público com parcimónia, seriedade e, claro, respeitando as prioridades.
[CP]: Sabendo que quem se recandidata leva sempre vantagem, por que é que aceitou?
[VR]: Servir é uma missão para mim, foi sempre a minha vida. É um dos meus ideais, era um imperativo cívico fazê-lo, para levar não promessas mas esperança às pessoas. Eu acredito mesmo nisso, em envolver mais as pessoas, ter a Câmara aberta para as ouvir, reactivar o orçamento participativo, por exemplo, levando-o para as freguesias, ou garantir que nenhum contacto de um munícipe fica sem resposta, o que me parece inadmissível. Estar perto dos presidentes das Juntas, não de forma episódica, mas como método de trabalho, porque é de um concelho que estamos a falar. E se eu acredito nisto, e acredito, não podia recusar.
Entrevista: Andreia Gouveia
Publicada na edição em papel do Campeão das Províncias de 27 de Fevereiro de 2025