Luís Filipe Rui Oliveira Caetano é uma figura destacada na área da gestão e desenvolvimento regional. Com uma vasta experiência académica e profissional, foi vice-presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro durante quase uma década e integra, desde 2018, o Conselho Jurisdicional e o actual Conselho de Supervisão da Ordem dos Contabilistas Certificados. Actualmente é Professor Adjunto no ISEC Lisboa e colabora com diversas instituições de ensino superior em pós-graduações. Autor do livro “Estratégia da política à gestão” (2004) e “Comercio Eletrónico” (2022), tem-se afirmado como especialista em economia, gestão e marketing digital, sendo presença regular em conferências e seminários sobre estas temáticas.
Campeão das Províncias [CP]: A experiência na Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro permitiu-lhe obter uma visão mais abrangente da região. Na sua perspectiva, continuam a verificar-se dificuldades na articulação entre as autarquias, ou têm sido dados passos concretos para uma maior cooperação e coesão territorial?
Luís Filipe Caetano [LFC]: A desorganização do Estado é um problema estrutural, reflectindo-se na perda de receitas e em despesas ineficazes. A articulação entre autarquias e poderes públicos continua a ser um desafio, pois muitas vezes falta consenso sobre prioridades e investimentos estratégicos. O exemplo do IP3 ilustra bem esta dificuldade: apesar da necessidade reconhecida, não há acordo sobre o traçado, o que impede avanços concretos. O investimento público em infra-estruturas tende a ser impulsionado por interesses externos, como aconteceu com a A25, que beneficiou do interesse espanhol. Esta demora na tomada de decisões compromete o desenvolvimento regional e a eficiência dos recursos.
[CP]: Significa isso que a região continua a enfrentar os mesmos problemas de falta de articulação entre autarquias?
[LFC]: A falta de articulação de todos os poderes públicos continua a ser um problema na região Centro, o que limita o desenvolvimento de projectos estruturantes e a valorização do seu património. Muitas vezes, há um desconhecimento ou subvalorização das potencialidades locais. No entanto, há casos que demonstram como uma estratégia bem definida pode fazer a diferença. O exemplo do Fundão é paradigmático: a aposta na valorização da cereja transformou a economia local, impulsionou a agricultura e atraiu investimento, tornando-se um motor de crescimento para o concelho. O Fundão soube alavancar um recurso endógeno, promovê-lo e criar valor em torno dele, demonstrando que uma gestão autárquica proactiva e articulada pode ter um impacto significativo no desenvolvimento regional.
[CP]: Refere-se ao presidente da Câmara do Fundão, Paulo Fernandes. O que torna a sua gestão um exemplo de sucesso?
[LFC]: O Paulo Fernandes é um exemplo de sucesso na gestão autárquica devido à sua visão estratégica e capacidade de inovar. Um dos maiores feitos foi a valorização da cereja, que triplicou o seu preço médio nos últimos 10 a 15 anos, passando de 1 a 1,5 euros por quilo para 3,5 a 4 euros. Esta valorização não só trouxe mais rendimento para os agricultores, com rendimentos líquidos de até 50.000 euros, em anos de produção normal, como também gerou riqueza e bem-estar para a região.
Além disso, Paulo Fernandes soube aproveitar os recursos do concelho de forma inteligente e inovadora. Um exemplo disso é a reconversão de um pavilhão multiusos com baixa taxa de ocupação. Transformado em uma unidade dedicada à informática, o espaço agora abriga grandes empresas da área, mantendo ainda a sua função desportiva. O pavilhão está agora completamente ocupado, 100% do tempo, e serve de modelo de como aproveitar infra-estruturas já existentes para gerar novas oportunidades económicas. Paulo Fernandes tem sido uma referência na região, com uma visão clara para o futuro, superando desafios históricos e colocando o Fundão numa trajectória de crescimento.
[CP]: Considera que Paulo Fernandes seria uma boa escolha para presidir à Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro (CCDR-Centro)?
[LFC]: Seria, sem dúvida, uma excelente escolha para liderar a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro (CCDR-Centro). A sua capacidade de alavancar o território, fomentar o desenvolvimento económico e implementar soluções criativas, como o exemplo da cereja do Fundão, são apenas algumas das suas qualidades que poderiam beneficiar a região Centro.
Ao longo da sua gestão, Paulo Fernandes tem demonstrado uma visão estratégica focada no crescimento e na sustentabilidade, que seria valiosa para a CCDR-Centro. Se ele assumisse essa posição, confiaria plenamente na sua capacidade de trazer dinamismo e inovação para a região, tal como fez no Fundão. A sua experiência, a forma como gere os recursos e a sua capacidade de criar parcerias são aspectos fundamentais que poderiam fazer a diferença na liderança da CCDR-Centro.
[CP]: Considera que a administração pública, de uma forma geral, é mal gerida, ao contrário do que se passa no sector privado?
[LFC]: A gestão pública, comparada à gestão privada, tem características bem distintas, especialmente no que toca ao risco e à transparência. No sector privado, o risco é intrinsecamente ligado à rentabilidade e à viabilidade do negócio. Já na administração pública, a gestão do dinheiro, sendo este público, deve ser muito mais exigente e transparente. Quando lidamos com dinheiro proveniente dos impostos dos cidadãos, há uma responsabilidade acrescida de garantir que os recursos sejam bem aplicados.
Em contraste com o sector privado, onde o foco é o lucro e a eficiência, na administração pública o dinheiro não é “vindo de um bolso privado”, mas sim de toda a sociedade. Isso implica que a gestão deve ser feita com um nível mais elevado de rigor, considerando sempre a transparência e o retorno que esses investimentos trazem para o bem-estar colectivo.
A título de exemplo, se considerarmos o poder autárquico em Viseu, que tem gerido ao longo de décadas uma quantidade substancial de recursos públicos, é legítimo perguntar: o que teria sido feito com tanto dinheiro se fosse bem aplicado? A gestão pública, portanto, deve ser alvo de constante escrutínio, com exigências claras de resultados tangíveis que beneficiem a população. Cada euro gasto deve ser justificado, e o impacto das políticas deve ser visível e mensurável. É fundamental que os cidadãos se tornem mais exigentes e vigilantes quanto à aplicação do dinheiro público, exigindo transparência e eficácia na utilização desses recursos.
[CP]: Que políticas deveriam ser implementadas para equilibrar a baixa densidade populacional que se verifica, especialmente no interior, e promover um desenvolvimento mais sustentável?
[LFC]: A baixa densidade populacional no interior do país é um desafio ligado ao desequilíbrio entre o litoral e o interior. Lisboa enfrenta uma sobrecarga de população que compromete serviços essenciais, enquanto o interior perde habitantes, com algumas autarquias a lutar para manter a sua população. Para resolver este problema, é fundamental que se invista na redistribuição da população, começando por tratar da alta densidade nas grandes cidades. Uma solução seria a implementação de uma fiscalidade diferenciada para o interior, com benefícios fiscais para empresas que se estabeleçam em regiões de baixa densidade. Além disso, é necessário investir em infra-estruturas essenciais como água, saneamento e transportes, para melhorar a qualidade de vida no interior e evitar a sobrecarga das grandes cidades.
[CP]: O que falta para que as lideranças políticas nos municípios sejam mais eficientes e adequadas às necessidades actuais?
[LFC]: Quando se fala de políticas públicas, é essencial que estas sejam implementadas com brio, com um compromisso sério e bem fundamentado, sem improvisações. Muitas vezes, assistimos à criação de leis que, pouco tempo depois, necessitam de correcções. Isto revela falta de previsibilidade e planeamento adequado, e o custo dessas falhas é alto. Não podemos continuar a agir dessa forma. Precisamos de um compromisso mais sério com o futuro, especialmente quando se trata de investimentos públicos e fundos comunitários. Se tratarmos os recursos financeiros como se fossem os últimos, teremos mais cuidado na sua aplicação, evitando desperdícios e maximizando os benefícios para a comunidade.
Essas questões levantam a necessidade de rejuvenescer as lideranças políticas e renovar as estratégias municipais. O “mofo” que se acumula nas velhas políticas só impede o desenvolvimento. É essencial abrir as janelas para que entre luz, ar fresco e novas ideias. Se não fizermos isso, podemo-nos tornar cúmplices de políticas e decisões que, mais cedo ou mais tarde, terão consequências negativas para todos. Mudar a metodologia para obter diferentes resultados.
[CP]: Já sabe quem vai concorrer a Viseu?
[LFC]: Para já, estão anunciados três candidatos para as eleições em Viseu. O Partido Socialista anunciou João Azevedo, que, inclusive, é a única pessoa com quem tenho uma relação pessoal. Pelo lado do Chega, o candidato é Bernardo Pessanha. Quanto ao PSD, o nome mais provável é o de Fernando Ruas, que recentemente participou num evento no Instituto Politécnico, onde o líder da bancada, Hugo Soares, expressou apoio à sua candidatura, dizendo “contamos consigo”. No entanto, pessoalmente, acredito que ele já merece descanso, dada a sua idade, e que talvez seja o momento de procurar novos líderes para dar mais espaço ao rejuvenescimento do partido.
Lino Vinhal/Joana Alvim