Coimbra  27 de Março de 2025 | Director: Lino Vinhal

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Mário Velindro vai candidatar-se à Presidência do Politécnico de Coimbra

9 de Fevereiro 2025 Jornal Campeão: Mário Velindro vai candidatar-se à Presidência do Politécnico de Coimbra

Mário Velindro, presidente do Instituto Superior de Engenharia de Coimbra, nascido em Angola, é doutorado em Engenharia Mecânica, com especialização na área de Tecnologia de Produção. Iniciou a sua carreira na Indústria, na área de projecto de equipamentos industriais. Já com uma experiência relevante, iniciou a sua actividade académica como professor no Departamento de Engenharia Mecânica do Instituto que actualmente preside (ISEC), cargo que mantém até hoje. Ao longo da sua trajectória, Mário Velindro assumiu diversas funções de relevo, incluindo a de Pró-Presidente do Instituto Politécnico de Coimbra (IPC), entre 2014 e 2017.

Campeão das Províncias [CP]: A engenharia tem enfrentado novos desafios com o avanço da tecnologia. Como é que os engenheiros têm respondido a essas exigências?

Mário Velindro [MV]: A engenharia tem respondido de maneira eficaz e adaptativa aos novos desafios impostos pelos avanços tecnológicos, especialmente nas áreas relacionadas com a computação. A crescente procura por engenheiros qualificados tem sido evidente, e os alunos do ISEC, ao concluírem os seus cursos, inserem-se rapidamente no mercado de trabalho, o que reflecte a grande necessidade de profissionais com competências técnicas especializadas e a qualidade dos nossos diplomados.

Com o aumento do recurso a novas tecnologias, observa-se uma procura crescente por especialistas, particularmente nas áreas de engenharia informática, redes e programação. Embora os desafios sejam inúmeros, acredito que os maiores ainda estão por vir. Vivemos numa era em que a ciência, tal como a conhecemos, já não é suficiente para responder a todas as questões. Apesar dos significativos avanços alcançados, ainda há muito por descobrir. A busca incessante pelo conhecimento continua a impulsionar a investigação em várias áreas, desde os fenómenos cósmicos até outros campos fundamentais da física.

À medida que novas descobertas são feitas, torna-se cada vez mais evidente o quanto ainda falta entender sobre o universo que nos rodeia. A ciência está em constante evolução, desvendando um universo vasto e repleto de mistérios, e a engenharia, sem dúvida, desempenhará um papel fundamental na resolução dos desafios futuros.

[CP]: Ainda há muito por descobrir?

[MV]: A física, como campo de estudo, continua a apresentar vastas áreas inexploradas, e, apesar dos avanços significativos ao longo dos últimos séculos, há ainda muito por descobrir. O universo é repleto de mistérios que desafiam as leis da física, e a nossa compreensão sobre as forças fundamentais que o regem está longe de ser completa. Neste contexto, um dos maiores desafios atuais é o campo da física quântica, que continua a desafiar as fronteiras do conhecimento humano.

Stephen Hawking, um dos maiores físicos da contemporaneidade, deixou-nos legados de grande relevância neste domínio, com contribuições que continuam a inspirar e a desafiar os cientistas. Em particular, Hawking abordou questões fundamentais sobre os buracos negros e a natureza da gravidade quântica. Uma das suas descobertas mais notáveis foi a teoria da radiação dos buracos negros, mais conhecida como radiação de Hawking, que sugere que os buracos negros não são completamente “negros”, mas emitem radiação devido a efeitos quânticos próximos ao horizonte de eventos. Esta teoria contradiz as visões clássicas da física e abriu novas possibilidades para compreender a interação entre a gravidade e a mecânica quântica, duas das forças mais complexas do universo.

Além disso, Hawking levantou questões ainda não resolvidas sobre a natureza da singularidade no interior dos buracos negros e a possível existência de um “multiverso” — um conceito que propõe a existência de múltiplos universos além do nosso, cada um com as suas próprias leis físicas. Estes desafios, entre outros que ele deixou, continuam a impulsionar o avanço da investigação da física quântica, onde a compreensão da realidade à escala subatómica parece ainda estar longe de um consenso definitivo.

A física quântica, com as suas contra intuições e resultados paradoxais, desafia até os conceitos mais básicos de espaço, tempo e causalidade. Por exemplo, o princípio da indeterminação de Heisenberg, que afirma que não é possível conhecer simultaneamente a posição e a velocidade exactas de uma partícula, continua a ser uma das pedras angulares da mecânica quântica, mas também um dos seus maiores mistérios. Tais fenómenos deixam claro que estamos apenas a arranhar a superfície do que é, na realidade, uma disciplina extraordinariamente complexa e em constante evolução.

Portanto, os desafios deixados por Hawking e outros físicos contemporâneos evidenciam que, apesar dos avanços, ainda há muito por descobrir no campo da física. A busca por uma teoria unificada da gravidade quântica, a compreensão da natureza da matéria escura e a exploração de novos conceitos sobre o tempo e o espaço continuam a ser algumas das fronteiras mais estimulantes e misteriosas da ciência.

 

[CP]: Esta noção do desconhecido é estimulante ou é assustador?

[MV]: Os desafios impostos pelo desconhecido podem ser tanto estimulantes quanto assustadores, dependendo da perspectiva. No campo da engenharia, esses desafios apresentam-se como oportunidades valiosas para o desenvolvimento de novas tecnologias, especialmente na área da computação, que continua a mostrar um potencial imenso. Um dos maiores desafios actuais é a transição dos computadores digitais para os computadores quânticos, um avanço que resulta da evolução da computação e da energia quântica. Essa mudança exigirá enormes esforços, especialmente nas áreas da automação, da robótica e da inteligência artificial, onde as possibilidades são praticamente ilimitadas.

Por outro lado, é assustador ter a noção que afinal, quando se pensava que dominávamos todos os fenómenos e que as leis conhecidas eram intocáveis, não percebemos muitos dos acontecimentos físicos que surgiram. Tudo acontece com naturalidade porque a humanidade continua sem entender, com rigor, como tudo o que conhecemos se formou. Este é um dos maiores mistérios da física moderna.

O físico Albert Einstein, reflectindo sobre os mistérios do universo, afirmou: “O mais belo sentimento que podemos experimentar é o sentimento do mistério. É a fonte de toda a arte e ciência verdadeira”. Este sentimento é, sem dúvida, o que nos impulsiona a continuar a explorar os limites do conhecimento, apesar das incertezas que surgem ao longo do caminho.

De forma semelhante, o físico Richard Feynman, ao abordar a natureza fundamental da física, disse: “Se acha que entende a mecânica quântica, então não entende a mecânica quântica”. Este comentário reflete a complexidade e o fascínio do desconhecido, um campo onde, apesar de grandes avanços, ainda estamos a dar os primeiros passos.

 

[CP]: Os alunos do secundário quando se inscrevem num curso superior vão preparados?

[MV]: Penso que, em termos gerais, os alunos que se inscrevem num curso superior não estão suficientemente preparados para os desafios do ensino superior. Embora o ensino secundário tenha aspectos positivos, considero que ele exige uma revisão substancial e até uma verdadeira revolução. Embora existam boas práticas, penso que seria essencial promover um esforço mais consciente para que, no último ano do ensino secundário, os alunos tivessem uma compreensão mais profunda do que envolve o ensino superior. Este processo permitiria que os estudantes compreendessem melhor a dinâmica e a realidade das universidades e institutos politécnicos, facilitando uma transição mais eficaz e informada. Por exemplo, os alunos deveriam poder escolher o curso numa fase mais avançada dos estudos secundários.

O ISEC, por exemplo, já recebe centenas de alunos do ensino secundário todos os anos, proporcionando visitas aos seus laboratórios e permitindo-lhes conhecer o ambiente académico. Embora estas iniciativas sejam importantes, penso que são insuficientes. Seria importante implementar formas adicionais de aproximação entre o ensino secundário e o ensino superior, como organização de palestras informativas, maior troca de experiências e um envolvimento mais estreito entre as duas fases da educação.

Um exemplo interessante de como um país tem lidado com esta questão é Singapura. O governo de Singapura tem desenvolvido um sistema educacional que integra de forma eficaz o ensino básico e secundário, com uma ênfase no desenvolvimento de competências práticas e no alinhamento das expectativas dos alunos com as exigências do ensino superior e do mercado de trabalho. Desde os anos 80, Singapura tem implementado um currículo flexível, com uma forte aposta em programas de orientação vocacional e carreiras já no ensino secundário. Além disso, as escolas secundárias frequentemente colaboram com universidades e outras instituições de ensino superior para criar programas pré-universitários, onde os alunos podem obter uma experiência mais próxima do ambiente académico.

A abordagem de Singapura é particularmente notável pela sua ênfase em preparar os alunos para uma transição suave e informada para o ensino superior, o que é realizado através da oferta de oportunidades de aprendizagem mais práticas, bem como pela promoção de um maior envolvimento com o mundo universitário ainda durante o ensino secundário. Esta estratégia tem mostrado resultados positivos, com uma crescente taxa de sucesso e adaptação dos alunos ao ensino superior.

 

[CP]: O que torna a ciência e a engenharia tão fascinantes para si?

[MV]: A ciência e a engenharia são áreas particularmente fascinantes porque nos confrontam constantemente com novos mistérios e desafios. Costuma-se dizer que, ao completarmos um curso superior, passamos a ser estudantes para toda a vida, e é justamente por causa da natureza inexplorada do conhecimento que a ciência nos oferece que temos a sensação de que há sempre mais a aprender, mais a descobrir. Embora o progresso alcançado até hoje seja notável, existe ainda um vasto campo por explorar, o que torna a jornada intelectual interminável e instigante.

A engenharia, como outras áreas do saber, não encontrará respostas definitivas para todas as questões que levanta; e é precisamente essa indeterminação que contribui para o seu fascínio. O desconhecido, o não resolvido, são componentes fundamentais que impulsionam a investigação e a inovação, mantendo viva a busca pelo conhecimento.

Se nos centrarmos num campo quase filosófico, surgem questões ainda mais profundas. Por exemplo, quando confrontados com os grandes enigmas do universo, muitas vezes recorremos à explicação de que tudo foi criado por uma entidade superior. No entanto, a verdade é que permanecem muitas perguntas sem resposta, como os mistérios que envolvem fenómenos como os buracos negros. Estes, por exemplo, têm a característica singular de poderem evaporar repentinamente, sem que se saiba o destino da energia que contêm. Esta é uma questão que, até o momento, não possui uma explicação.

O saber, portanto, é fundamental, mas também traz consigo uma multiplicidade de novas perguntas. Embora isso possa, por vezes, causar uma sensação de desconforto diante do desconhecido, é precisamente esse aspecto que torna o conhecimento tão valioso. O saber, em última instância, não ocupa lugar, mas expande a nossa compreensão sobre o mundo e desafia os limites da nossa percepção.

 

[CP]: O que distingue o ISEC das outras escolas de engenharia em Portugal?

[MV]: Conheci o ISEC em 1982, quando ainda era uma escola superior jovem, criada em 1974, com cursos de bacharelato. Ao longo dos anos evoluiu, tendo-se integrado no Instituto Politécnico de Coimbra em 1986/87. A sua qualidade reflecte-se na empregabilidade dos alunos, que rapidamente encontram colocação, e na crescente procura pelos seus cursos.

Desde que assumi a presidência em 2017, o ISEC passou de 17% para quase 50% de alunos que o escolhem como primeira opção, atraindo estudantes com médias de 17 e 18 valores.

Nos últimos anos o ISEC, contando com uma vasta equipa, entrou num processo de “aceleração contínua”. Fomos pioneiros em Portugal com a abertura da licenciatura na área das Smart Cities (Gestão Sustentável das Cidades) e criámos a licenciatura em Informática Industrial para responder às necessidades da indústria. Além disso, lançámos um mestrado profissionalizante em Sistemas Avançados de Gestão da Saúde, que permite a profissionais com experiência obterem o grau de mestre em cerca de um ano.

A vertente prática é um dos nossos pilares, com mais de 40 laboratórios activos, incluindo o único laboratório de máquinas hidráulicas no país. Criámos ainda um centro de investigação em parceria com a Universidade Lusófona, o RCM2+, com cerca 40 investigadores já envolvidos, e estamos a trabalhar para apresentar o nosso primeiro doutoramento.

As parcerias com empresas de referência são outro factor chave. Trabalhamos com centenas de empresas que nos ajudam a crescer e a consolidar. São mais de 500 protocolos com empresas de referência. O ISEC continua a crescer e a afirmar-se como uma escola de excelência na engenharia, algo de que me orgulho profundamente.

[CP]: Tenciona candidatar-se à presidência do Instituto Politécnico de Coimbra?

[MV]: Não excluo a hipótese de assumir esse desafio. Com 16 anos de experiência na indústria, 19 anos dedicados ao ensino na área da Engenharia Mecânica, 4 anos como Pró-Presidente no IPC e sete anos na liderança do ISEC, sinto-me plenamente preparado para encarar esta responsabilidade.

O Politécnico de Coimbra tem dado alguns passos significativos, destacando-se principalmente as suas escolas, como a Escola Superior de Tecnologias da Saúde, a Escola Superior Agrária e a Coimbra Business School. Esta última chegou a atingir mil alunos em programas de pós-graduação e continua a ser uma das maiores do país. A Escola Superior de Educação e a Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Oliveira do Hospital também têm realizado um trabalho exemplar na resposta às necessidades do mercado, demonstrando a relevância e a qualidade da formação oferecida.

Ao avançar para este novo ciclo, o meu foco estará centrado nas pessoas, promovendo a inovação, a cooperação e a valorização da comunidade académica. Há vários anos defendo o conceito de “Universidade Politécnica”, não por questões de vaidade, mas como uma estratégia que reconhece e valoriza a qualidade do ensino que ministramos. Em muitos países, o termo “politécnico” é associado a instituições de ensino de nível médio, o que, por vezes, prejudica a percepção pública sobre o verdadeiro valor da nossa oferta educativa.

O Instituto Politécnico de Coimbra tem demonstrado um percurso sólido e um prestígio crescente. Parte das suas escolas, algumas centenárias, existiam antes da criação do IPC e sempre se distinguiram pela excelência do seu ensino. O futuro exige adaptação e cooperação, e estou preparado para contribuir ativamente para esta evolução.

Nos últimos sete anos, conseguimos reestruturar e qualificar o ISEC, apesar dos dois anos de pandemia e de diversos constrangimentos. É este dinamismo e capacidade de crescimento que pretendo continuar a impulsionar, reforçando o papel do IPC no panorama académico e na sociedade.

[CP]: Já tem uma equipa pensada?

[MV]: Gostaria de esclarecer que a minha candidatura não está associada a pré-acordos nem a cadernos de encargos. Apresento-me às eleições de forma independente, com o objectivo de desenvolver um plano estratégico que esteja alinhado com o crescimento e a evolução estruturada da instituição.

A minha abordagem passa por construir uma estratégia sólida, que envolva activamente todos os membros da comunidade que desejem contribuir de forma construtiva para o desenvolvimento do Politécnico. Acredito que o futuro da instituição deve ser construído de forma colaborativa, permitindo que todos os que se sintam comprometidos com o seu progresso possam ter voz e participar na definição das orientações estratégicas.

O foco será, portanto, promover uma gestão aberta e inclusiva, em que a participação activa de docentes, alunos, funcionários e outros intervenientes seja fundamental para alcançar os objectivos propostos. A constituição de uma equipa será, portanto, um processo orientado pela necessidade de integrar pessoas competentes e motivadas, capazes de contribuir de forma significativa para o fortalecimento e a inovação da instituição.

Lino Vinhal/Joana Alvim