Coimbra  27 de Março de 2025 | Director: Lino Vinhal

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Victor Baptista vê um PS de Coimbra frágil para as autárquicas

19 de Janeiro 2025 Jornal Campeão: Victor Baptista vê um PS de Coimbra frágil para as autárquicas

 

Víctor Manuel Bento Baptista, nascido em 1952, é um economista cuja trajectória profissional se destaca pela longa ligação à política e à gestão pública. Com um forte vínculo a Coimbra, construiu uma carreira marcada por cargos de destaque, incluindo deputado, Governador Civil, líder da Federação Distrital de Coimbra do PS e presidente do Coimbra iParque, entre outras funções de relevância no panorama político e administrativo.

 

Campeão das Províncias [CP]: Nas últimas eleições para a liderança da Federação de Coimbra do PS tivemos apenas lista única e João Portugal foi eleito. Acabou a oposição no PS de Coimbra?

Victor Baptista [VB]: Ao longo dos anos, mantive uma participação activa no Partido Socialista. Fui um dos poucos que esteve permanentemente envolvido, inclusive em processos eleitorais como candidato. Cumpri três mandatos na Concelhia de Coimbra e outros três na Distrital, tendo ainda contado votos em cinco ocasiões na Distrital. No último acto eleitoral optei por não me envolver. Percebi que havia outros socialistas com a ambição de se candidatarem e manifestei total disponibilidade para apoiar. No entanto, mais tarde, constatei que essas ambições não se materializaram, pois não formalizaram candidaturas.

 

[CP]: A avocação da escolha do candidato em Condeixa-a-Nova é normal?

[VB]: Antes de falar de Condeixa, deixe-me referir que a nomeação em Soure é surpreendente e levanta várias questões. A escolha do candidato para a Câmara Municipal deveria ser um acto de congratulação para o PS, especialmente considerando a sua história no concelho. No entanto, o que temos assistido é uma gestão errática da direcção distrital, que parece mais focada em interesses internos do que em uma escolha estratégica e fundamentada.

É simbólico que, no mesmo dia da tomada de posse dos novos órgãos, tenha sido decidido o nome de João Gouveia como candidato à Câmara de Soure. A rapidez desta escolha, sem o devido cuidado e reflexão, levanta questões sobre a coerência e a gestão política da distrital. Não compreendo a falta de intervenção da direcção distrital em Soure, enquanto em Condeixa houve uma actuação contrária. A liderança distrital parece estar a adoptar um comportamento contraditório, com uma atitude de “dupla personalidade, condicionada por interesses pessoais ou familiares.

Quanto ao caso de Condeixa, a situação é igualmente preocupante. Em vez de fomentar a comunicação e a coesão, está-se a construir um muro que impede o crescimento do Partido. A escolha de candidatos deveria ser decidida pela Comissão Política Concelhia, como está estipulado pelos estatutos, e não ser condicionada por interesses de controlo de continuidade. No caso de Condeixa, a professora doutora Liliana Pimentel foi eleita com mérito e a sua candidatura deveria ser apoiada, não contestada, honra a história do PS no concelho.

 

[CP]: O PS arrisca-se a ter muitos independes socialistas como candidatos?

[VB]: Sim, existem indícios que apontam para dificuldades no processo de escolha de candidatos, o que, naturalmente, gera incerteza. Quando os processos demoram, é sinal de que algo se está a passar nos bastidores. Tenho informação de que ainda existem problemas por resolver em concelhos como Miranda do Corvo, Montemor-o-Velho e Poiares. Estas situações em concelhos liderados pelo Partido Socialista indicam uma falta de clareza e de consensos internos, o que contribui para um cenário de incerteza. Esse ambiente de instabilidade pode, sem dúvida, afectar os resultados eleitorais, uma vez que a falta de coesão e de escolhas bem fundamentadas tende a fragilizar a posição do Partido nas eleições.

 

[CP]: Para candidata à Câmara de Coimbra pelo PS fala-se em Ana Abrunhosa. É uma boa candidata? E na Figueira da Foz?

[VB]: Na Figueira da Foz vivemos um jogo de sombras. Os potenciais candidatos à Câmara Municipal fazem lembrar a história do gato escondido com o rabo de fora: querem ser candidatos, mas aguardam pela decisão de Santana Lopes, cuja candidatura já parece evidente. Figurativamente, a política local parece-se com uma sala cheia de políticos que, mais do que líderes, se assemelham a anões. João Portugal, líder distrital, e a líder concelhia, deputada, devem assumir responsabilidades políticas. Afinal, são líderes para quê? Se não querem correr riscos nem enfrentar desafios, não se candidatam, preferindo tratar da sua vida pessoal.

O Partido Socialista, para ser alternativa, precisa de uma preparação antecipada e de um rosto credível. Não há sacrifício em enfrentar Santana Lopes, que não é imbatível. No entanto, construir soluções alternativas requer coragem política, algo que muitos evitam ao procurar terceiros para assumir a responsabilidade. Esta abordagem é arriscada, especialmente num contexto em que a Direcção Nacional parece ter um papel crucial, inclusive em Coimbra.

A atracção do PS, em Coimbra, por um modelo próximo do Bloco de Esquerda 2.0 não faz sentido numa cidade com um histórico político específico. A solução passa por estudos de opinião rigorosos para identificar o melhor candidato, respeitando a tradição do partido.

É essencial que o PS faça escolhas conscientes e informadas, baseadas em sondagens e não em decisões pré-definidas. Quando o candidato for escolhido, estarei disponível para apoiar, porque essa é a minha obrigação enquanto militante.

 

[CP]: Ainda esteve à frente do Coimbra iParque durante o mandato deste presidente de Câmara, José Manuel Silva. Como tem analisado o desempenho deste Executivo?

[VB]: Saí do iParque em Maio de 2022 e desde então tenho estado distante da actividade da Câmara Municipal e, ainda mais, do iParque. Em termos de investimentos, o projecto mais visível em Coimbra é o Metro. Não se pode atribuí-lo à actual liderança municipal, pois é uma iniciativa anterior, lançada no mandato de Manuel Machado. A decisão de avançar com o Metro foi tomada numa reunião do Conselho de Ministros realizada em Coimbra, na qual eu era governador civil. Na mesma reunião foram aprovados dois grandes projectos: a ponte Rainha Santa, que avançou rapidamente, e o Metro, que sofreu inúmeros atrasos e alterações de percurso. Esses atrasos, em parte, podem ser atribuídos ao doutor Encarnação, algo que já afirmei publicamente como vereador, estando registado em acta. Em certos momentos, o processo foi adiado excessivamente e os fundos alocados acabaram redireccionados para outros investimentos. Posteriormente, a chegada da Troika complicou ainda mais a situação.

Quanto a outros investimentos, não noto grandes obras de origem recente. Mas a vida é assim: uns iniciam, outros concluem, e a realidade é que as obras têm de continuar.

 

[CP]: Já estão em marcha as eleições Presidenciais. António José Seguro poderá ser o candidato apoiado pelo PS?

[VB]: Considero que a candidatura presidencial é uma iniciativa que resulta da vontade individual dos candidatos. Os partidos podem optar por apoiar ou não, mas essa é uma questão distinta. Gostaria até de aproveitar a oportunidade para dizer que, pessoalmente, não concordei com a introdução de primárias durante a liderança de António José Seguro. Na altura, considerei essa decisão um erro político, como já expressei antes. A lógica de recorrer a primárias ou de apresentar candidaturas de última hora parece assentar numa estratégia oportunista: uma espécie de “vamos ver no que dá”.

Julgo que, no actual contexto constitucional, o próximo Presidente da República deve ser alguém com vasta experiência política, dada a complexidade dos desafios nacionais e internacionais que enfrentamos. Em relação a possíveis candidatos, é provável que nomes como Luís Marques Mendes e o almirante Gouveia e Melo avancem. Parece inevitável, embora nenhum deles tenha, até ao momento, oficializado a sua candidatura, com o cenário da primeira volta a apontar para a existência de quatro ou cinco candidatos.

 

[CP]: Como está a ver o desempenho de Pedro Nuno Santos como secretário-geral do PS?

[VB]: Pedro Nuno Santos é um jovem e promissor político, situando-se na faixa etária dos 40 anos, semelhante à idade de António Guterres quando assumiu o cargo de Primeiro-Ministro. Actualmente tem optado por uma postura mais discreta e menos exposta. Esta estratégia, a meu ver, pode ser positiva, pois o excesso de visibilidade tende a desgastar as lideranças.

Contudo, tenho algumas reservas quanto à forma como o Partido Socialista tem gerido certas questões, como a segurança. Há uma aparente falta de orientação estratégica, com decisões que parecem ser tomadas ao sabor das circunstâncias. Um exemplo disso foi a demora em clarificar a posição relativamente ao Orçamento do Estado, o que criou a percepção de uma liderança pouco firme.