Coimbra  25 de Janeiro de 2025 | Director: Lino Vinhal

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Viagem às prisões políticas da ditadura

11 de Janeiro 2025 Jornal Campeão: Viagem às prisões políticas da ditadura

Entre 1926 e 1974 milhares de pessoas foram presas por razões políticas e, muitas delas, nunca tiveram direito a julgamento ou foram indiciadas por qualquer crime específico. Para muitos destes homens e mulheres, condenados a intermináveis períodos de prisão, tentar fugir era a única forma de reconquistar a liberdade e retomar a luta no exterior.

É deste período da história que se pode dizer que esta iniciativa (‘Prisões Políticas da Ditadura’) encerra uma espécie de roteiro às prisões da polícia política do Estado Novo. Uma viagem negra, tortuosa e marcante, e que se insere no âmbito das celebrações dos 50 anos do 25 de Abril, lançada pela Comissão Comemorativa.

Falamos de um guia digital sobre as prisões políticas da ditadura portuguesa, a sua narrativa e os episódios mais relevantes que aconteceram dentro das suas portas, décadas a fio. Um novo trabalho, ao dispor dos cidadãos, que demonstra, através de textos e imagens, a forte repressão política que o Estado Novo exerceu sobre os seus opositores, em Portugal e nas colónias africanas, nomeadamente através da politização e instrumentalização do sistema judicial.

Este conteúdo foi disponibilizado a 3 de Janeiro deste ano, o dia em que, há 65 anos, teve lugar uma das mais conhecidas fugas de presos políticos do regime salazarista: 10 presos políticos, incluindo Álvaro Cunhal, que no ano seguinte seria eleito secretário-geral do Partido Comunista Português (PCP), escaparam da cadeia do Forte de Peniche, um edifício de alta segurança controlado pela polícia política, a PIDE.

A actividade da polícia política viria a intensificar-se com início da guerra em Angola (1961), na Guiné (1963) e em Moçambique (1964). Para além da sede da PIDE em Lisboa e das delegações do Porto e de Coimbra, que dispunham de cárceres próprios, em Portugal a polícia política utilizava também muitos outros estabelecimentos prisionais: esquadras da PSP, aquartelamentos da GNR, calabouços dos Governos Civis, as Penitenciárias de Lisboa e do Porto, os presídios militares do Forte de Elvas, do Forte de Sacavém, do Presídio Militar de Santarém e da Casa de Reclusão da Trafaria (antigo Presídio Militar da Trafaria). A PIDE dispunha ainda, desde 1934, de prisões privativas: Aljube e Forte de Caxias.

Vigiar, punir, torturar

Maria Inácia Rezola, historiadora e Comissária Executiva da Comissão Comemorativa 50 anos 25 de Abril, explica que “o regime de Oliveira Salazar e de Marcelo Caetano colocou o sistema judicial na dependência do Governo para assegurar a defesa da ditadura”. Recorda que “o recurso abusivo às medidas de prisão preventiva e de segurança, os julgamentos sem advogado de defesa, a criação de tribunais especiais militares e tribunais plenários para julgar crimes políticos, e as condenações sem possibilidade de recurso foram instrumentos fundamentais para a repressão e neutralização dos adversários do regime”. Com prisões próprias, “a polícia política vigiava, punia e torturava os que ousavam desafiar a ordem estabelecida, em Portugal e nas colónias”, acrescenta.

Este trabalho aborda os seguintes temas: ‘A Ditadura Militar e a Deportação de Presos Políticos’, ‘Os crimes políticos no Estado Novo’, ‘Prisão preventiva e medidas de segurança’, ‘Os presos políticos em Portugal’ e ‘A libertação dos presos políticos em Portugal e nas colónias’.

É ainda disponibilizada informação sobre prisões e campos penais situados em Portugal – como a Cadeia do Aljube, o Forte de Caxias (Forte D. Luís I) e o Forte de Peniche – e nas Colónias – como o Campo de Concentração do Tarrafal, em Cabo Verde, a Colónia Penal do Bié, em Angola, ou a Cadeia da Machava, em Moçambique.

Esta iniciativa decorre no âmbito das celebrações dos 50 anos do 25 de Abril.

Comemorações até 2026

As comemorações dos 50 anos do 25 de Abril tiveram início em Março de 2022 e vão decorrer até 2026. Cada ano foca-se num tema prioritário, tendo como objectivo reforçar a memória e enfatizar a relevância actual destes acontecimentos na construção e afirmação da democracia.

O período inicial das comemorações foi dedicado aos movimentos sociais e políticos que criaram as condições para o golpe militar. A partir de 2024, revisitam-se os três ‘D’ do Programa do Movimento das Forças Armadas (MFA), em iniciativas que evocam o processo de descolonização, a democratização e o desenvolvimento. O ano de 2025 é dedicado às primeiras eleições livres.

Texto: Ana Clara (Jornalista do “Campeão” em Lisboa)

Foto Cadeia de Peniche: ANTT, SNI

Publicado na edição em papel do Campeão das Províncias de 9 de Janeiro de 2025