O Governo garante que em 2025 vai “actualizar todas as pensões segundo as regras em vigor”, tendo em conta a inflação e o crescimento da economia. “A actualização [das pensões] será a que resulta da lei”, afirmou o ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, depois de, na conferência de imprensa para apresentar as linhas gerais do OE, ter sido questionado sobre qual será o aumento das pensões e do Indexante dos Apoios Sociais no próximo ano.
Os aumentos anuais das pensões dependem de um mecanismo previsto na Lei 53-B/2006, que tem em conta a evolução dos preços no ano anterior e o desempenho da economia. Os valores definitivos da inflação (sem habitação) e do Produto Interno Bruto (PIB) só serão conhecidos no final de Novembro, pelo que o Governo não revelou com que dados está a trabalhar.
Mas, numa análise ao Orçamento do Estado (OE) para 2025 (OE/2025), o economista Eugénio Rosa, não tem dúvidas: “há aumentos de pobreza nas pensões em 2025 (entre 1,25% e 2%)”.
“A proposta do OE/2025 não tem nada de bom para os pensionistas nem para a maioria dos trabalhadores das Administrações Públicas”, começa por explicar. Em relação aos reformados e aposentados, a lei do Orçamento “não contém nenhuma disposição que melhore as baixas pensões” e lembra que o primeiro-ministro, Luís Montenegro, em declarações públicas, informou que, no próximo ano, aplicar-se-ia a Lei 53-B/2006. “Sabendo que isso causaria o descontentamento dos pensionistas, pois os aumentos nem garantem a manutenção do poder de compra das pensões, acenou com um hipotético
suplemento, pago uma única vez no segundo semestre de 2025, se existir excedente para isso”, refere.
Em relação aos trabalhadores, garante o economista, “não existe nada na lei do OE sobre o aumento geral das suas remunerações, apenas no relatório há um quadro onde, textualmente, se lê o seguinte: ‘valorização salarial de €52,63, com mínimo de 2%’”. Ou seja, “um valor inferior à inflação em 2024 e certamente também à de 2025”, adianta.
Eugénio Rosa recorda que “a situação dramática” dos pensionistas em Portugal é clara: “as pensões médias mensais aumentaram com Pedro Passo Coelho entre €4 e €6 por ano, e com António Costa entre €8 e €16, mas continuam abaixo do limiar da pobreza”. (Quadro 1).
“Apesar dos aumentos médios em euros das pensões mensais durante o Governo de António Costa terem variado entre o dobro (invalidez e sobrevivência) e o triplo (velhice) dos aumentos médios anuais feitos no Governo de Passos Coelho, mesmo assim eles foram ridículos (entre €8 e €16) e insuficientes para tirar da pobreza a esmagadora maioria dos pensionistas”, contextualiza o autor do estudo. A agravar a situação, frisa, “há ainda uma profunda desigualdade nas pensões médias entre homens e mulheres, consequência e prolongamento da desigualdade de salários que se verifica na vida activa. (Gráfico 1, Relatório OE/2025).
Sobre as disparidades de pensões por sexo, Eugénio Rosa conclui: “em 2013, a pensão média de velhice da mulher era apenas 57,3% da do homem; em 2015, 57,1% e, em 2023, 57,2% da do homem. Em euros a diferença entre mulheres e homens até se agravou: 2013: €-237; 2015: €-246; 2023: €-315. Como se tudo isto já não fosse suficiente, entre 2024 e 2025, a idade normal de acesso a reforma aumenta de 66 anos e 4 meses para 66 anos e 7 meses. Para os que se reformarem antecipadamente é mais um corte na pensão de 1,5%”, acusa.
O que diz a lei 53-B/2006?
Segundo Eugénio Rosa, a lei 53-B/2006 de actualização das pensões “tem de ser alterada rapidamente, pois não garante a manutenção do poder de compra das pensões”.
O economista fez as contas e segundo o artigo 6º daquela lei, se a média do aumento real do PIB dos dois últimos anos for inferior a 2% (em 2023 foi 2,3% e este ano, segundo o Banco de Portugal, será 1,6%, o que dá uma média de 1,95%, inferior a 2%) o aumento das pensões em 2025 será o seguinte: a) pensões até 2 IAS (€1038) o aumento será igual à inflação anual registada em Novembro, que deve ser 2% (se média do PIB fosse > 2%, o aumento seria 2,5%); b) pensões superiores a 2 IAS mas inferiores a 6 IAS (€3115): inflação menos 0,5 p.p., o aumento das pensões será 1,5%; c) pensões superiores a 6 IAS e menos de 12 IAS: inflação menos 0,75 p.p., as pensões aumentarão 1,25%.
Eugénio Rosa não tem dúvidas: Luís Montenegro “pretende reduzir o poder de compra dos pensionistas da Segurança Social (SS) e Caixa Geral de Aposentações (CGA), apesar do OE/2025 prever um saldo positivo na SS de 5650 milhões de euros. E vai utilizá-lo não para fazer aumentos dignos das pensões, mas para ficar com folga para compensar os 525 milhões que custa o IRS Jovem”. Esta, sublinha, “é uma situação perversa” já que “poderá acontecer com o IRS Jovem o que acontece com o IVA, quando se diminui a taxa e muitas empresas ficam com ele, não baixando os preços”. E teme que “também muitos patrões vão aproveitar o IRS Jovem para baixar ainda mais os salários pagos aos jovens (porque não têm de pagar IRS)” e suportar a perda de receita de 200 milhões de euros de IRC (21% para 20%) sem aumentar o défice orçamental (este inclui a SS).
Administrações Públicas
No OE/2025 estão inscritos 597 milhões de euros, o montante que o Governo destina à actualização das remunerações base dos trabalhadores das Administrações Públicas.
Em junho de 2024, segundo a Direcção-Geral da Administração e do Emprego Público (DGAEP),” o seu número era 749.678, e não 746.500 em 2024, como consta do quadro da página 193 do OE (no quadro 5.11 mantém-se o número para 2025 que só pode ser interpretado como a recusa do Governo em contratar os trabalhadores que faltam nos serviços)”.
Dividindo os €597 milhões pelos 749.678 trabalhadores e por 14 meses, obtém-se €56,88 por trabalhador e por mês (se se deduzir o IRS, CGA e ADSE, fica reduzido a €40/mês). Como a remuneração base mensal no fim do primeiro trimestre de 2024 era, segundo a DGAEP, €1754,5 (mais €56,88) representa um aumento médio de +3% (em relação ao ganho médio o aumento é 2,7%).
“É este o aumento que Montenegro tem para os trabalhadores, e tem o descaramento de, no relatório do OE/2025, incluir um longo ponto intitulado ‘Valorizar os profissionais’. Na Administração Pública, pelas funções que exercem, 55,8% têm o ensino superior (professores, médicos, magistrados, técnicos superiores, etc.), no sector privado os que têm ensino superior são 28,4%. A pergunta que naturalmente se coloca é esta: com aumentos na remuneração base de €56,8 (€40 líquidos) e com promoções (subida de um nível remuneratório que corresponde a um aumento que varia entre 48 e €55) que só se consegue ao fim de 5 a 10 anos de serviço, será possível atrair ou mesmo manter trabalhadores qualificados e com elevadas competências? E o poder de compra actual das remunerações é ainda inferior ao de 2011”, questiona. (Quadro 2)
Recorde-se que a discussão e votação do OE/2025 está marcada para os dias 30 e 31 de Outubro. Segue-se depois a discussão na generalidade e, finalmente, a votação final global, a 29 de Novembro.
Texto: Ana Clara (Jornalista do “Campeão” em Lisboa)
Publicado na edição em papel do Campeão das Províncias de quinta-feira, dia 24 de Outubro de 2024