“Obsolescência é a qualidade de obsolescente ou obsoleto; característica do que está a cair em desuso, a tornar-se antiquado”.
Do latim obsolescentĭa, particípio presente neutro plural substantivado de obsolescĕre, «cair em desuso».
A obsolescência programada, na sua essência, é a pré-determinação do ciclo de vida de um produto. Como se, ao nascer, se inscrevesse, na sua matriz, a concreta data do seu passamento, da sua morte. Como se o produto, no momento do seu lançamento no mercado, se fizesse acompanhar já de uma certidão de óbito, com a data pré-definida do seu fim…
Constituindo o resultado natural da inovação & desenvolvimento tecnológicos, representa em si um enorme problema se se manifestar precocemente ou, o que é pior, se for, de caso pensado, programada.
Em qualquer das hipóteses, a desactualização (e a depreciação sob qualquer das perspectivas) dos equipamentos electrónicos, p.e., ocorre em momento temporal anterior ao expectável em vista da vida útil normal de um tal tipo ou categoria de bens de consumo.
Há quem acentue a diferença entre a obsolescência precoce [ou prematura] e a obsolescência programada que se funda, aliás, na intenção posta no fenómeno:
– a obsolescência programada é, como o nome indica, determinada pelos produtores ou fabricantes, como forma de promover o acesso pelos consumidores a novos produtos, mais elaborados, tecnologicamente mais avançados e, em princípio, com uma mais adequada “performance”;
– a obsolescência precoce assenta na natureza própria dos materiais empregues na produção que fenecem, soçobram, se esgotam numa dada dimensão temporal…
A Lei-Quadro de Defesa do Consumidor, no n.º 7 do seu artigo 9.º, em aditamento cujo começo de vigência ocorreu a 28 de Maio de 22, reza o seguinte:
“É vedada ao profissional a adopção de quaisquer técnicas através das quais o mesmo visa reduzir deliberadamente a duração de vida útil de um bem de consumo a fim de estimular ou aumentar a substituição de bens.”
O que equivale a dizer:
“É proibida a obsolescência prematura”!
E a obsolescência programada é crime, em França, como entre nós…
Estudos do Gabinete Europeu do Ambiente permitem concluir que o tempo de vida útil de um smartphone, em relativo equilíbrio com os ciclos naturais e humanos de reposição de recursos, deveria situar-se entre os 25 e os 232 anos.
Outra é a realidade: a “vida útil” de um smartphone é, hoje em dia, de 3 anos…
A aprovação de regras que estendam a longevidade de alguns dos bens, em 5 anos, representaria, no Espaço Económico Europeu, a diminuição de 12 milhões de toneladas anuais de equivalente-CO2, o que significaria retirar de circulação 15 M de veículos movidos a combustíveis fósseis… num universo de 250 M…
Um novo “direito à reparação” se instituiu, no ordenamento europeu, de molde a dar mais vida às coisas.
Reparar… por forma a que seja mais acessível manter o produto que substituir, descartando-o?
Ou será mais oneroso reparar pelo valor da mão-de-obra com que mercado ora nos brinda?
Tal dependerá obviamente da categoria dos produtos e da sua peculiar concepção…
Trata-se, na realidade, de uma autêntica revolução a que tende a esboçar-se.
Será que a inversão do paradigma não constituirá obstáculo à “Inovação & Desenvolvimento”?
Tratar-se de um direito transversal susceptível de recair sobre todos e cada um dos bens de consumo?
Ou o seu sentido e alcance é bem menos extenso do que se projectara?
O facto é que a Directiva ‘Direito à Reparação’ que a lume veio a 10 de Julho p.º p.º e obrigará à adaptação das legislações nacionais até 31 de Julho de 2026, só contempla, no quadro actual, 10 dos bens de consumo ali previstos, a saber:
Máquinas de lavar roupa para uso doméstico e máquinas combinadas de lavar e secar roupa para uso doméstico
Máquinas de lavar louça para uso doméstico
Aparelhos de refrigeração
Ecrãs electrónicos
Equipamento de soldadura
Aspiradores
Servidores e produtos de armazenamento de dados
Telemóveis, telefones sem fios e tábletes
Secadores de roupa para uso doméstico
Bens em que estejam incorporadas baterias de meios de transporte ligeiros.
Ainda que com a abertura para inclusão de mais bens,
A Directiva cria uma Plataforma Europeia em Linha que incluirá ferramentas de fácil utilização para a pesquisa dos reparadores por Estado-Membro.
E ainda um Formulário Europeu de Informação sobre as Reparações que auxiliará a identificar e escolher serviços de reparação de proximidade adequados.
(*) Presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO – Portugal