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Mário Jorge Nunes prepara-se para encerrar um ciclo em Soure

16 de Junho 2024 Jornal Campeão: Mário Jorge Nunes prepara-se para encerrar um ciclo em Soure

Mário Jorge Nunes, o actual presidente da Câmara de Soure, está à frente do Município há quase 12 anos e encontra-se a cerca de um ano e meio de concluir o seu último mandato. Durante a sua liderança conseguiu manter a maioria absoluta do Partido Socialista no Executivo camarário.

 

Campeão das Províncias [CP]: Falta um ano e meio para se despedir da Câmara de Soure, já está a sentir nostalgia?

Mário Jorge Nunes [MJN]: Não. Há um cansaço extremo, assumo. No dia 1 de Junho de 2008, voltei a entrar no Município de Soure, no edifício dos Paços do Concelho, para ser adjunto do então presidente da Câmara, João Gouveia. Mantenho-me lá a trabalhar até hoje e, portanto, daqui a um ano e pouco, se tiver saúde, terminarei as minhas funções e pretendo afastar-me completamente de qualquer actividade política e descansar. Em 2008 entrou-se numa crise internacional financeira que depois nos veio afectar. E nós, desde 2008 até agora, passámos por diversos momentos muito conturbados. Portanto, é um fim de ciclo. Se me pergunta se todos os sonhos foram realizados, eu diria que não, mas, fazendo uma análise mais cuidada, porventura, o normal no ser humano é sonhar muito.

 

[CP]: O que vai ficar por fazer e que gostaria de ver concretizado?

[MJN]: A questão das obras é vista como a superação das necessidades básicas das populações. Nos anos 70 e 80 era essencial garantir água e estradas, criar associações comunitárias e infra-estruturas básicas. O país estava atrasado economicamente e era necessário criar bases para o desenvolvimento. Hoje, as prioridades mudaram: os jovens e a sociedade valorizam qualidade e segurança nas infra-estruturas, parques, pavilhões e piscinas. Ainda há falhas graves, como a falta de saneamento básico em muitas áreas do concelho de Soure, que necessita de soluções tecnológicas e viáveis financeiramente.

Nos últimos anos houve esforço na criação de infra-estruturas, utilizando fundos para agregar recursos. Ainda falta resolver a questão do saneamento básico. Além disso, a dificuldade em reunir terrenos para áreas empresariais persiste, mas há investimentos significativos, como o recente projecto de uma empresa espanhola que criará 200 postos de trabalho até 2025.

Temos também iniciativas de incubadoras de empresas e centros de inovação social que estão a dar frutos. O Município, em parceria com o IPN, está a trabalhar na captação e avaliação de novos projectos empresariais. Espera-se que, até ao final do ano, o novo centro de inovação social esteja completamente operacional.

Finalmente, o Município espera concretizar a compra do Cineteatro Sourense, para o transformar num centro de indústrias criativas, promovendo as artes e a criatividade, áreas que têm demonstrado grande potencial em Soure.

 

[CP] Tinha a pretensão de melhorar os acessos de Soure à A1. É uma obra que vai ficar por fazer?

[MJN]: Nós temos uma ligação que não é feita por nenhuma estrada nacional. Como tal, o Estado até hoje tem lavado as mãos do problema. A auto-estrada tem que ser servida por estradas municipais e o Município tem que se chegar à frente, e vai chegar, espero dentro de dias, para resolver um problema que está pendente com o grupo Sonae por uma pequena parcela de terreno para fazer a consignação da obra, que está adjudicada desde Janeiro. Temos que lhe chamar outra coisa que não via rápida, que não variante, é apenas uma melhor ligação. Porque depois, consoante a linguagem que se usa, há outras consequências, há outras normas. Mesmo assim, é uma obra que vai custar um milhão e meio de euros, 100% suportado pelo Município. A União Europeia decidiu que a questão da rodovia era uma prioridade negativa. Portanto, investimento rodoviário é todo feito com financiamento municipal e nós também somos um Município com rendimentos medianos e utilizamos 2/3 do rendimento em funções sociais. Esta é uma questão política que eu assumo. Nós temos uma receita média, entre transferências do orçamento geral do Estado, receitas próprias do IMI, do IRS e algumas taxas, ali na ordem dos 14 milhões de euros. Conseguimos, depois, com candidaturas e com outros tipos de financiamento, como foi o caso do orçamento para 2024, chegar aos 25 milhões de euros, como foi o orçamento de 2023, em que conseguimos ultrapassar os 23 milhões, mas é com grande criatividade e com grande esforço.

 

[CP]: A ferrovia é uma solução ou um problema? Vai obrigar a muitas alterações em Soure?

[MJN]: Quando em 2012-2013 assumi a presidência da Câmara, a minha revolta com a Administração Central era enorme. Sempre servimos os outros: passava uma auto-estrada, linhas de alta tensão, gasodutos, a linha do Norte, tudo atravessava o concelho, mas nada ficava. Apenas nos deram um nó, como uma noiva sem véu. Se esperássemos pela noiva, quando viesse, já estaria velha para casar.

A linha de alta velocidade vai afectar directamente algumas pessoas, que espero sejam indemnizadas, mas outras nunca o serão. Haverá sofrimento durante a obra, mas também uma oportunidade. As regiões por onde a alta velocidade passar terão obras durante cerca de 4 anos. No nosso caso será um ponto de partida e chegada, atraindo grande movimento de empresas e consórcios de construção. Será uma oportunidade para a economia local e espero que os munícipes vejam isto de forma positiva.

Embora Soure não tenha uma estação de TGV, será mais uma passagem importante. A construção da infra-estrutura trará benefícios à hotelaria, restauração e outros serviços, necessitando de uma ampla gama de materiais e equipamentos.

 

[CP]: A questão do Plano Director Municipal (PDM) como está?

[MJN]: O PDM é muito mais difícil de resolver do que esperávamos, tanto nós como todos os outros municípios, devido a uma grande instabilidade legislativa. Os instrumentos de gestão territorial, como o PDM, são documentos agregadores que recebem contributos de 27 entidades, sendo apenas uma delas o Município e as restantes de âmbito nacional. A Câmara intervém através de regulamentos locais, enquanto as entidades nacionais regulam-se por leis, decretos-lei e portarias, que estão sempre acima na hierarquia legislativa.

Espero que em Setembro possamos levar o produto final à Assembleia Municipal e que haja bom senso para o aprovar, pois muitas pessoas têm as suas vidas pendentes da aprovação deste PDM. Apesar de haver diferentes perspectivas ideológicas ou pessoais, espero que haja consenso para resolver o problema das pessoas. Há mudanças de conceitos e instrumentos que regulam a ocupação do solo, como a Carta de Perigosidade dos Incêndios, que é um instrumento nacional que limita a vontade local. Ainda hoje, concelhos como Lafões pedem prolongamento.

Se o PDM for aprovado, cerca de 500 famílias e pessoas verão os seus problemas resolvidos no concelho de Soure, incluindo infra-estruturas empresariais, pequenas oficinas, comércio, pequena indústria e habitações. Espero que os autarcas tenham o bom senso de viabilizar esta solução possível, mesmo que não seja a ideal. Um PDM não precisa de durar quase 30 anos, como o de Soure, que teve 6 alterações, quatro delas nos meus mandatos, para corrigir pequenas situações.

 

[CP]: Quanto é que já gastou com a transferência de competências?

[MJN]: São contas fáceis de fazer. Desde 2018, cerca de 20 competências foram transferidas do Estado central para as autarquias. As mais impactantes são a educação, a saúde e a acção social. Na área da acção social já prestávamos um serviço muito semelhante ao actual, sem receber nada por isso. Actualmente, Soure tem 13 IPSS distribuídas pelas várias freguesias. Se não tivéssemos apoiado estas IPSS antes da transferência de competências, teríamos de gastar agora centenas de milhares de euros.

No caso da educação, a situação é mais complicada. Em 2023, o nosso défice na educação foi de cerca de 400 mil euros. Isto porque, para cumprir os rácios obrigatórios, gastaríamos X, mas acabámos por gastar 1,5 milhões, resultando numa diferença de 400 mil euros. Esta diferença deve-se ao facto de cada freguesia, mesmo a mais pequena, ter um jardim-de-infância e uma escola primária em funcionamento. Isto não existe em mais lado nenhum, nem mesmo em municípios com dimensões semelhantes às nossas. Além disso, oferecemos serviços de apoio à família e prolongamento de horário. Dos 400 funcionários do Município, 150 trabalham na área da educação.

 

[CP]: A reabilitação da Escola Básica ainda vai acontecer no seu mandato?

[MJN]: Submetemos a candidatura em Abril. É um projecto complexo com um investimento de quase 7 milhões de euros. Resultará numa escola completamente nova, com as mesmas infra-estruturas e layout, mas com uma grande melhoria na eficiência energética, que era o principal foco do financiamento, e um arranjo exterior adequado às novas necessidades, incluindo a remodelação das redes de fibra, águas, saneamento, electricidade e fornecimento de gás às cantinas. Espero que para o próximo ano, por esta altura, esteja a lançar o concurso, visto que o projecto está pronto, iniciando a obra no ano que vem, para estar concluída em meados de 2026.

Outra grande obra negociada foi a do Centro de Saúde, cujo contrato assinei na sexta-feira passada. O investimento no Centro de Saúde de Soure é de cerca de 2 milhões de euros, e tenho que apressar o concurso para concluir a obra durante 2025, o que não será fácil, pois temos que encontrar uma solução para onde funcionará esta instalação enquanto a obra decorrer.

Entrevista: Luís Carlos Melo/ Joana Alvim

Publicada na edição do “Campeão” em papel de quinta-feira, dia 13 de Junho de 2024