Coimbra  27 de Abril de 2025 | Director: Lino Vinhal

Semanário no Papel - Diário Online

 

João Gabriel Silva

25 de Abril no Ensino Superior e na Ciência

25 de Abril 2024

A transformação trazida pelo 25 de Abril ao ensino superior e à ciência em Portugal é muito profunda.

No ensino superior quase basta dizer que o número de estudantes mais do que quintuplicou. Em 1978 eram pouco mais de oitenta mil, e em 2022 havia mais de 430 mil estudantes no ensino superior, apesar de a população total se ter mantido bastante estável, com apenas uma ligeira subida de 9 para 10 milhões de habitantes. Isto é, em 1978 apenas pouco mais de 5% dos jovens em idade universitária frequentava o ensino superior, e actualmente são cerca de 50%. O ensino superior deixou de estar aberto apenas a uma elite restrita, para passar a estar aberto a todos.

A integração internacional do ensino superior português também melhorou imenso. Portugal deixou de ser uma ilha isolada e passou a estar a par com o que se faz no resto do mundo desenvolvido. Isto vê-se por exemplo no facto de, na década de 70 do século passado, os portugueses emigrarem essencialmente para trabalhos menores, só por excepção ocupando empregos que pedissem conhecimentos avançados. Agora os diplomados portugueses são procurados para profissões qualificadas em todo o mundo.

Na Ciência a transformação foi ainda mais profunda. Antes do 25 de Abril de 1974 a investigação científica fundamental efectuada em Portugal era residual. A investigação aplicada era quase inexistente, sendo os produtos portugueses exportados praticamente todos baseados em mão-de-obra barata, competindo apenas em preço. Actualmente tudo mudou. Nas universidades portuguesas quase todos os professores se dedicam à investigação científica e publicam os seus resultados em revistas internacionais. A investigação aplicada é uma realidade transversal, efectuada quer nas universidades, quer nas próprias empresas, quer em muitas instituições dedicadas à inovação, de que o Instituto Pedro Nunes é uma excelente exemplo. Portugal exporta actualmente muitos produtos que competem em qualidade e em tecnologia em resultado desta evolução.

Dez vezes mais doutorados

A dimensão desta transformação vê-se particularmente bem na produção de doutorados. Antes do 25 de Abril quase todos os doutorados portugueses eram professores universitários (onde eram aliás uma minoria) e tinham-se doutorado no estrangeiro. Actualmente Portugal forma cerca de 10 vezes mais doutorados do que as necessidades do corpo docente das universidades, e muitos encontram emprego fora de Portugal. Aliás, um entendimento que ainda não foi devidamente absorvido pela sociedade portuguesa é que Portugal atingiu um patamar que outros países desenvolvidos já atingiram há muito: obter o grau de doutor não significa ser um professor universitário, ou mesmo um investigador, mas sim atingir uma qualificação muito elevada que é muito relevante para as empresas, essencialmente pela grande capacidade de resolução de problemas complexos que o grau de doutor demonstra. Só uma pequena minoria fica nas universidades e instituições de investigação.

Os benefícios da democracia são enormes e Portugal é a prova viva disso mesmo. É mais uma razão para não podermos permitir que uma ditadura sanguinária aniquile uma democracia, como há o perigo de a Rússia conseguir fazer na Ucrânia, perante a cobarde inação dos estados democráticos. Onde está, por exemplo, o reforço da indústria de defesa portuguesa, para nos prepararmos para um mundo onde já não vamos poder contar com a protecção das forças armadas dos Estados Unidos da América? Também neste sector é necessária muita inovação, e Portugal pode dar uma boa contribuição.

(*) Presidente da Direcção do Instituto Pedro Nunes e ex-Reitor da Universidade de Coimbra