Coimbra  20 de Abril de 2025 | Director: Lino Vinhal

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137 anos da Escola Superior Agrária de Coimbra: liderança e visão estratégica de Rui Amaro

21 de Abril 2024 Jornal Campeão: 137 anos da Escola Superior Agrária de Coimbra: liderança e visão estratégica de Rui Amaro

 

Rui Amaro, actual presidente da Escola Superior Agrária de Coimbra (ESAC), tem desempenhado várias funções de liderança ao longo dos anos, contribuindo significativamente para o crescimento e desenvolvimento da Instituição. A sua visão estratégica tem sido fundamental para posicionar a escola como uma instituição preparada para enfrentar os desafios futuros.

 

Campeão das Províncias [CP]: A Escola Superior Agrária faz 137 anos, como vão decorrer as comemorações?

Rui Amaro [RA]: São 137 anos, desde 1887 aqui na cidade de Coimbra. Comemoram-se também este ano os 45 anos do ensino superior Politécnico, cujo primeiro diploma data de 1979. As nossas comemorações são sempre “ligeiras” e servem, sobretudo, para fazer o ponto da situação, ano após ano, daquilo que vamos conseguindo concretizar e do que projectamos para o futuro. Este ano vai ser um pouco diferente, pois vamos fazê-la no edifício do picadeiro da Escola. Entendemos que vale a pena dar a conhecer os diferentes espaços que a escola tem e o picadeiro é um edifício centenário que temos vindo a recuperar pouco a pouco. Para além disso, dada a proximidade dos 50 anos do 25 de Abril, teremos uma ligeira evocação dessa data, através da nossa Tuna, de um aluno que declamará alguns poemas alusivos e um momento de conversa com o Engº Vasco Paiva. Depois decorrerá a homenagem aos aposentados, a apresentação dos novos trabalhadores que, entretanto, entraram na Escola e, também, um reconhecimento ao Núcleo Equestre da Associação de Estudantes para salientar o trabalho diferenciado que têm realizado em prol da Escola. Finalmente, depois dos discursos de circunstância em que contamos com a natural participação do presidente do Politécnico, teremos um momento equestre, com cavalos da Escola montados ou apresentados por estudantes.

 

[CP]: Como estamos de oferta formativa na Escola Agrária?

[RA]: Destacaria nesta ocasião, pela oportunidade, as novas licenciaturas de Agronomia e de Zootecnia que se iniciarão em 2024/25, em resultado da remodelação da nossa oferta formativa, bem como a formação na área florestal. Nestas áreas, tal como na área das indústrias agroalimentares, temos formações que vão desde os Cursos Técnicos Superiores Profissionais (CTeSP) até às licenciaturas e aos mestrados. Deve salientar-se que somos uma das três instituições que em Portugal oferece uma licenciatura na área florestal, sendo provavelmente a que possui o maior número de alunos; ainda que esta área não seja muito apetecível para os jovens que ingressam no ensino superior, são muitas as solicitações com ofertas de emprego que recebemos e para as quais não conseguimos dar resposta.

A área alimentar, que engloba a transformação de produtos agrícolas e animais, também é um ponto forte da nossa oferta formativa pelo que oferecemos cursos nos três níveis – CTeSP, licenciatura e mestrado.  Mas, porque a Escola Agrária um conjunto de formações que vai para além da área da agricultura, importa referir as formações existentes na área do Ambiente (licenciatura e mestrados) e as licenciaturas em Biotecnologia, em Turismo em Espaços Rurais e Naturais e, até este ano a mais recente, em Enfermagem Veterinária. Este leque de formações tem sempre em comum a importância das várias vertentes da sustentabilidade e tem a enorme vantagem de poder usufruir do espaço maravilhoso e polifacetado que temos ao nosso dispor e que funciona como laboratório vivo para cada uma das áreas em que trabalhamos.

Finalmente, não posso deixar de referir a liderança da Agrária de Coimbra num consórcio de outras escolas de outros politécnicos que submeteu uma proposta para o Doutoramento em Sustentabilidade Agroalimentar e Ambiental. Trata-se de um passo em frente para o reconhecimento do ensino superior politécnico e que, mercê da forte atividade e classificação do centro de investigação iniciado na ESAC há mais de vinte anos – CERNAS (Centro de Estudos de Recursos Naturais, Ambiente e Sociedade), podemos vir a estar na linha da frente ao nível nacional.

 

[CP]: Como está a Escola em número de alunos?

[RA]: O número de alunos tem crescido nos últimos anos e o nosso esforço é no sentido de dar continuidade a um crescimento sustentado nas diferentes áreas de formação. No total, actualmente temos cerca de 1.250 alunos, número que ainda comporta algum crescimento para um patamar interessante para as nossas condições. Sendo importante salientar este aspecto positivo, também se deve dar nota do que corre menos bem, como é o caso do abandono escolar que sentimos particularmente neste último ano lectivo. Relativamente aos alunos que entraram, tendo ocorrido um efetivo aumento do número de alunos, algum tempo depois, verifica-se que um conjunto de estudantes deixa de frequentar, muito provavelmente pelas dificuldades das pessoas e das famílias em fazerem face aos encargos de viver em Coimbra; como já referi anteriormente, quando estávamos em off, não é por questões financeiras associadas ao pagamento de propinas, pois tentamos sempre resolver todas essas situações com planos de pagamento e/ou outras soluções, como bolsas. Creio que não se devem escamotear os elevados valores do alojamento e de um conjunto de outras questões que afetam os jovens nos dias de hoje. O ponto positivo a salientar é o facto de o Politécnico de Coimbra ter encontrado formas de financiamentos específicos para combater estes problemas e que passam por trazer maior oferta nas novas residências para estudantes a construir no atual espaço da Agrária e a disponibilização de ferramentas adicionais para uma melhor integração dos novos alunos.

 

 [CP]: Que áreas é que estão a investigar?

[RA]: É um pouco como a formação que ministramos: há uma grande abrangência de temáticas. Em todo o caso, destaco um conjunto de projetos aprovados no âmbito do PRR e do financiamento específico para a investigação, estando a Escola Agrária está envolvida em cerca de uma dezena de projectos e responsável por três a nível nacional. São vários os que abordam as questões do uso do solo, da sustentabilidade e da economia circular, bem como outros que visam o conhecimento e a preservação de variedades autóctones, ou do planeamento na área florestal ou dos recursos hídricos. Também a questão das novas tecnologias aplicadas a diferentes setores, como a agricultura, é uma realidade na atual investigação e pode dar ferramentas úteis a empresários dispostos a estar mais bem preparados para o futuro. Por exemplo, um projectos passa por associar a produção agrícola à produção de energia elétrica com painéis fotovoltaicos, tentando encontrar soluções que combatam ao que muitos de nós não gostamos de ver e que é a ocupação de solos agrícolas com painéis fotovoltaicos. Este projecto tenta juntar as duas atividades, associando a prática da agricultura e a produção de energia eléctrica no mesmo espaço, e conjugar isso com a flexibilidade das tarifas horárias. Portanto, é um projecto estruturante para aquilo que será o futuro, nesta tão enfatizada transição energética que pode e deve ter aplicação na agricultura.

 

[CP]: Para além das licenciaturas e mestrados, a escola Agrária tem outros cursos, nomeadamente os de Técnicos Superiores Profissionais. O que são?

[RA]: Estes cursos permitem que alunos com o 12.º ano entrem directamente no ensino superior sem ser através do concurso nacional de acesso. No caso dos CTeSP existentes na ESAC, são cursos especializados, com um caráter prático e de forte aplicação que utilizam valências existentes na Escola em função das temáticas que são ensinadas; é o caso do setor dos equinos para o curso de Maneio de Equinos e Equitação Terapêutica, das oficinas tecnológicas de lacticínios e de hortofrutícolas para o curso de Controlo e Qualidade na Indústria Agroalimentar, os equipamentos e as sinergias com empresas e entidades do setor florestal no curso da Defesa da Floresta, ou a área certificada em agricultura biológica para o curso de Produção Agrícola Biológica. São formações com um período obrigatório de estágio e que conferem a possibilidade de creditação parcial de créditos quando o estudante ingressa numa licenciatura da ESAC. Temos ainda a funcionar algumas micro credenciações, como podas em fruteiras e videiras, detecção e controlo de práticas e doenças, compostagem, práticas de fogo controlado, produção de queijos e iogurte, inseminação artificial e diversos cursos relacionados com a enfermagem e a medicina veterinária.

 

[CP]: A ESAC tem produção própria para venda ao público?

[RA]: Sim, temos a Loja da Agrária, aberta à comunidade exterior, onde apenas vendemos produtos feitos por nós, como sejam queijos e compotas de diferentes tipos, vinho, manteiga, iogurtes, infusões, fruta da época, ovos, etc.. Não é um espaço grande, mas é de muita qualidade, onde os frescos são colhidos no dia, onde coexistem produtos biológicos e convencionais, mas sempre produzidos com respeito pelas pessoas e pelo meio ambiente. Importa neste contexto reforçar a ideia de que um produto para ser comercializado como “biológico” tem de estar certificado, ou seja, deve obedecer a um caderno de encargos que define como se pode fazer, o que se pode e não pode utilizar para produzir. Na Agrária de Coimbra temos uma área certificada a caminho dos 20 ha, onde as atividades são acompanhadas por um organismo de certificação, sobretudo na área dos produtos hortícolas, da fruticultura, das arvenses e das leguminosas para grão. Esta é mais uma diferenciação presente na Escola Agrária de Coimbra onde os estudantes se envolvem, aprendem fazendo e vêem o resultado da sua participação ter um retorno a preço justo.

Entrevista: Luís Santos/ Joana Alvim

Publicada na edição do “Campeão” em papel de quinta-feira, dia 18 de Abril de 2024