O Inverno está sensivelmente a meio caminho. Não obstante o mês de Janeiro ter presenteado os portugueses com dias excepcionalmente amenos, somos ainda fustigados pelo frio intenso, por chuvadas vigorosas (e tanta falta fazem sobretudo nalgumas zonas do país onde a seca não desarma), por um céu cinzento. A exposição à luz solar tem um efeito directo na produção de serotonina e melanina, portanto não surpreende que o nosso corpo e o nosso humor oscilem ao sabor das estações. A melancolia invernosa é há muito conhecida e o Inverno não é exactamente a mais popular estação para gozar férias. Muitos andam, pois, com os olhos postos no horizonte do calendário, que nos promete para Março a chegada da Primavera.
Esse horizonte sazonal é mais exigente para quem está em Bruxelas, pois convida-nos a olhar mais para longe. Embora a Primavera tenha início na mesma data em todo o hemisfério Norte, na Bélgica, ao contrário do que sucede em Portugal onde o mês de Março costuma ser portador de dias amenos e com Sol generoso, há que cultivar a paciência e esperar até finais de Abril para o cinzentismo começar, pouco a pouco, a esfumar-se.
Esta longa espera não tem, porém, que ser desesperada. As árvores urbanas funcionam como embaixatrizes da Natureza no centro das cidades. Agora que a maior parte delas se encontra despida de folhas, elas olham-nos no seu silêncio imperturbável, com os esguios ramos aguardando que a Primavera traga as folhas que as hão-de cobrir e os pássaros que nelas hão-de pousar. Neste entretanto, distraídos que andamos pelas temperaturas baixas, com o corpo enrolado em agasalhos e os pés ocasionalmente protestando se os sapatos não os salvaram de um pequeno dilúvio, facilmente podemos cair no erro de ignorar os demais sinais que a Natureza nos dá.
Em Bruxelas, as árvores da cidade começam, discretamente, a apontar o caminho para a Primavera. Há várias espécies na capital belga que se cobrem de flor já nesta altura do ano. Se as cerejeiras japonesas de Bruxelas ainda nos fazem esperar mais algumas semanas até podermos admirar o esplendor cor-de-rosa com que tingem as ruas, outras espécies começam já a ostentar um manto glorioso de cor, oferecido por flores cor-de-rosa ou brancas. Esses ramos que nos presenteiam com uma beleza ímpar são os verdadeiros núncios da boa nova: o inverno não é eterno, a Primavera há-de vir, não há escuridão que resista à luz e a Natureza não regateia a beleza que nos oferece em qualquer altura do ano.
Quem em Portugal tem um jardim com camélias sabe que nesta altura elas estão gloriosas. No meu caso, tenho especial apreço pelas magnólias que pontuam Coimbra. Em especial, a magnífica magnólia que fica ao lado do Teatro Académico de Gil Vicente e que, por esta altura, deverá ter já visíveis as suas incontáveis flores brancas. Não podemos deixar que o devir quotidiano nos prive deste espectáculo gratuito e belíssimo. Em breve, virão as folhas que ofuscarão a beleza das flores. Os ramos floridos têm boas notícias para nós, assim saibamos parar e escutá-los com o olhar.