As desigualdades de remunerações entre homens e mulheres em 2022 (últimos dados conhecidos) continuam a ser muito elevadas em Portugal. São tanto maiores quanto mais elevada é a qualificação e o nível de escolaridade das trabalhadoras.
De acordo com um estudo do economista Eugénio Rosa, que analisou os dados, “contrariamente ao que o Governo diz, a desigualdade não diminuiu em euros entre 2015 e 2022. Portanto, um cenário muito diferente do cor-de-rosa que António Costa pretendeu dar no seu último discurso de Natal como primeiro-ministro”, refere o economista, lembrando que isso mesmo se prova, utilizando os dados dos quadros de pessoal das empresas de 2022 divulgados pelo Ministério do Trabalho.
Segundo a análise de Eugénio Rosa, em 2022, as mulheres receberam menos 4993 milhões de euros que os homens com idênticas qualificações, sendo que estamos perante uma “violação do princípio para trabalho igual, salário igual”. A desigualdade é tanto maior quanto maior é a qualificação e o nível de escolaridade das mulheres, sendo que entre 2015 e 2022, os aumentos em euros para homens foram superiores aos das mulheres nas qualificações elevadas.
Neste estudo, utilizando dados das folhas de salários das empresas de 2022 enviadas por estas ao Ministério do Trabalho, e que este publicou em 2023, Eugénio Rosa demonstra que as desigualdades no que respeita às remunerações entre homens e mulheres continuam para níveis de qualificação e de escolaridade idênticas.
Os dados do quadro 1, são das próprias folhas de salários que as empresas, por lei, são obrigadas a enviar todos os anos ao Ministério do Trabalho, e que este compila, analisa e divulga.
A diferença média nas remunerações entre homens e mulheres em 2022 era de -13,4%, mas de ganhos, que inclui a remuneração base e todos os suplementos recebidos, era já de -16,2%. ´
“Desvalorização”
Mas se a análise for feita por níveis qualificação, diferença é muito maior, segundo o Ministério do Trabalho, sendo tanto maior quanto mais elevada é a qualificação da mulher (linhas do quadro coloridas a amarelo). Assim, a nível dos “Quadros superiores” as mulheres ganham, em média, menos 25,6% do que os homens, enquanto a nível de “Estagiários, praticantes e aprendizes” a diferença é muito mais pequena. Apenas -4,9%. “Em Portugal as empresas continuam a desprezar a função essencial da mulher na actividade produtividade e desvalorizam a qualificação. Com patrões assim dificilmente o país sairá do atraso em que se encontra”, considera Eugénio Rosa.
Segundo o economista, “um outro aspecto que confirma a conclusão anterior, e desmente as afirmações do Governo e de António Costa de que as desigualdades estão a diminuir é que, entre 2015 e 2022, os aumentos nas remunerações e nos ganhos em euros das mulheres foram maiores do que os dos homens apenas nos níveis de qualificação mais baixos, sendo inferiores nos níveis mais elevados como mostra o quadro 2 cujos dados foram calculados e divulgados pelo Ministério do Trabalho”.
Entre 2015 e 2022, os aumentos nas remunerações e ganhos médios das mulheres com maiores qualificações foram, em euros, inferiores às dos homens com idênticas qualificações (as das linhas coloridas a amarelo no quadro 2), registando-se uma situação inversa em relação as mulheres com menores qualificações em que os aumentos das remunerações e dos ganhos entre 2015/2022, em euros, foram superiores aos dos homens neste período (profissionais não qualificados, estagiários , praticantes e aprendizes).
As 1.494.230 mulheres trabalhadoras que constavam das folhas de salários enviadas pelas empresas ao Ministério do Trabalho receberam, em 2022, menos 3408,9 milhões de euros de remunerações base do que igual número de homens com idênticas qualificações e, em relação a “ganhos”, que inclui para além do salário base todos os outos complementos, o valor anual não recebido pelas mulheres pelo seu trabalho atingiu 4992,9 milhões de euros. Só as mulheres com o nível de qualificação de “quadros superiores” (142656) receberam menos 1298,1 milhões de euros de remunerações do que igual número de homens com as mesmas qualificações e menos 1519,4 milhões de euros de “ganhos”.
O que é estranho, afirma Eugénio Rosa, é que perante esta violação pelas empresas do art.º 59º da Constituição da República, que dispõe “que todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça …. têm direito à retribuição segundo … o princípio de que para trabalho igual salário igual”, sujeitando as trabalhadoras “a uma sobre-exploração e dando um sobre lucro aos patrões, governo, partidos, sindicatos, órgãos de comunicação social se mantenham passivos e mudos e que ignorem estes dados oficiais. Mais um princípio constitucional lançado às urtigas pelo Governo de Costa apesar da sua apregoada ‘Agenda de trabalho digno’”, conclui o economista na sua análise.
Ana Clara
Jornalista do “Campeão” em Lisboa
Texto publicado na edição em papel do “Campeão das Províncias” de 11 de Janeiro de 2024