Das antigas boticas, estabelecimentos onde os boticários preparavam e vendiam medicamentos, muitas vezes usando ingredientes naturais e ervas, pouco resta actualmente. Com o passar do tempo, e com as exigências que foram sendo impostas pela própria sociedade, a prática farmacêutica desenvolveu-se, expandiu-se em termos de serviços, tornando-se mais científica e regulamentada.
Esta transformação foi impulsionada, principalmente, pela robusta preparação técnica e diferenciação científica do farmacêutico, em todas as matérias relacionadas com a saúde pública, competências que, entretanto, encontraram respaldo na alteração ao Estatuto da Ordem dos Farmacêuticos ocorrida em 2001. Esta alteração estatutária veio determinar uma mudança de paradigma naquilo que era o objecto da actividade do farmacêutico, que passou de especialista do medicamento a uma atividade que tem como objetivo essencial a pessoa do doente.
Desde então, e de forma cada vez mais consolidada, a dispensa de medicamentos passou a ser a actividade complementar naquilo que é a prestação de cuidados ao doente e ao cidadão, e as farmácias são hoje amplamente reconhecidas como espaços de promoção da saúde e de prevenção de doenças, papel este que se tornou especialmente relevante no período crítico da recente pandemia por COVID-19.
As farmácias são espaços únicos nos sistemas de saúde, na medida em que permitem uma abordagem holística ao doente e ao cidadão, prestando diversos serviços assistenciais e, por outro lado, e não menos importante, apoiando o doente no encaminhamento para serviços mais diferenciados, sempre que necessário.
Para além da sua intervenção fulcral em todas as matérias relacionadas com os medicamentos e a adesão à terapêutica, o papel do farmacêutico tem-se revelado essencial no âmbito da promoção da saúde e da adoção de medidas preventivas da doença. Para citar somente alguns exemplos, o papel do farmacêutico, nas farmácias comunitárias, tem sido fundamental em áreas como a vacinação, inclusive aquelas que não fazem parte do Programa Nacional de Vacinação, no aconselhamento no âmbito da alimentação saudável e da promoção do exercício físico e de hábitos de vida saudáveis, de que são exemplos a cessação do tabagismo e a redução do consumo de álcool.
Os serviços de triagem de saúde estão, também, bastante generalizados nas farmácias. A medição da pressão arterial, os testes de glicemia e do perfil lipídico, entre outros, contribuem também para a identificação precoce de factores de risco na população, possibilitando intervenções oportunas e aconselhamento sobre mudanças no estilo de vida, resultando em melhores prognósticos.
Impulsionado pela recente crise sanitária, os farmacêuticos foram igualmente chamados a assumir o protagonismo noutras áreas, como sejam a renovação da medicação a doentes crónicos, a dispensa de medicamentos hospitalares nas farmácias comunitárias, ou a execução de testes rápidos de antigénio para diagnóstico da infecção por SARS-CoV-2.
Após a fase aguda da pandemia, muito há agora por fazer pela saúde dos portugueses. O farmacêutico tem agora, mais do que nunca, uma imensa responsabilidade no acompanhamento dos seus doentes e na promoção da saúde da população, em estreita colaboração com todos os outros profissionais de saúde, contribuindo para mitigar o impacto que, inevitavelmente, se notará na saúde da população, durante os próximos anos.
Este é um desafio que diz respeito a todos, e a dimensão desta exigência impele-nos a consciencializar que os bons resultados surgem com o trabalho conjunto e concertado de TODOS os profissionais. Sem disputas vãs e acessórias.
O interesse público é o interesse de todos, incluindo o nosso!
Anabela Mascarenhas
Presidente da Ordem dos Farmacêuticos Secção Regional do Centro