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Semanário no Papel - Diário Online

 

Hernâni Caniço

Amigos para sempre, ou amigos para cunhas?

16 de Junho 2023

Há ou não há limites para a importância e influência dos amigos na sua vida, valorizando ou desvalorizando (bizarro, mas real), admirando ou depreciando (por estranho que pareça), estimando ou desconsiderando (por razões que a razão desconheça).

Assim, há que ter em conta o grau de valorização quanto aos amigos terem uma vida exemplar em qualidade, capacidade e moral, em função de os amigos serem bons para ouvir os desabafos e serem ponderados nas apreciações, porque os amigos dão ânimo e estímulo combatendo o abatimento e a tristeza, os amigos motivarem-no para agir, ter iniciativas e acompanharem-no com frequência, e quanto aos amigos aceitarem “cunhas” e resolverem os problemas dos outros.

Os amigos terem uma vida exemplar, em qualidade, capacidade e moral, pode ser valorizado, por serem um exemplo de vida e uma referência, por serem uma conjugação de valor e ética, ou por haver desejo de atingir o seu nível e quiçá suplantá-lo. Ou pode ser pouco valorizado, por cada um querer seguir o seu próprio caminho sem influências externas, por ter outro tipo de conceitos e valores, ou por não ter amigos disponíveis e próximos.

Os amigos serem bons para ouvir os desabafos e serem ponderados nas apreciações, pode ser valorizado, como apreciação de qualidade máxima e ajustada do verdadeiro amigo, por haver um objectivo em relação ao fundamento “ser amigo”, ou por ser uma ajuda criteriosa com resultados adequados e sem motivos insidiosos. Ou pode ser pouco valorizado, por serem uma intromissão na peculiaridade da pessoa de ideias fixas, por darem uma lição / aprendizagem que não é desejada, ou simplesmente por não haver amigos.

Os amigos darem ânimo e estímulo, combatendo o abatimento e a tristeza, pode ser valorizado, por ajudarem a defrontar uma fase difícil que não se pretende duradoura, por apoiarem um problema em saúde ou bem-estar, ou resolverem um dilema e apresentarem solução. Ou pode ser pouco valorizado, pela força individual autónoma e a autocrítica adequada, por os amigos não serem oportunos, pertinentes e relevantes na questão específica em causa, ou porque a decisão ou decisões serem da competência e capacidade do próprio.

Os amigos motivarem-no para agir, ter iniciativas, acompanharem-no com frequência, pode ser valorizado como a essência da amizade, por gerar mobilização e acção útil em “roda de amigos”, ou por serem solidários sem condições. Ou pode ser pouco valorizado, por não constituírem uma fonte de ideias e atos úteis, por estarem indisponíveis ou serem apenas interesseiros, ou por serem “amigos da onça”.

Os amigos aceitarem “cunhas” e resolverem os problemas dos outros, pode ser valorizado, por considerarem ser essa a função principal dos amigos, por serem um recurso e uma força de desbloqueio assumidos pelo próprio, ou por acreditarem na simbologia da “cunha” como “instituição” e recomendação especial que intercede de forma decisiva. Ou pode ser pouco valorizado, por a “cunha” ser considerado um ato desprezível e de humilhação, por ser indigna da competência e da relação saudável não sendo “primus” interpares, e até eventualmente pela exigência de contrapartidas que não se desejam nem se dispõem a facilitar.

Os amigos para sempre fenecem. Pessoalmente, perdi amigos porque infelizmente pereceram, porque muitas vezes há longe e distância, porque eram conhecidos e não companheiros, porque eram donos da verdade absoluta, porque não correspondi ao pedido de “cunha” institucionalizada, ou porque não eram amigos de facto.

(*) Médico