O Dia Mundial do Ambiente, que se celebra na segunda-feira (5 de Junho), procura divulgar e alertar para a importância dos cuidados que todos nós, enquanto cidadãos, devemos ter para com o planeta em que vivemos. Marta Lopes é docente e coordenadora da Licenciatura em Tecnologia e Gestão Ambiental da Escola Superior Agrária de Coimbra (ESAC) e também investigadora no INESC Coimbra – Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores de Coimbra e falou ao Campeão das Províncias de como a ESAC prepara os seus alunos para uma melhor gestão do ambiente, bem como considera a região de Coimbra em termos ambientais.
1. O tema deste ano do Dia Mundial do Ambiente é sobre o combate à poluição plástica. Na sua opinião, quão importante é esta problemática?
O plástico desempenha uma função útil no nosso dia-a-dia, com aplicações importantes em várias actividades. Em 2021, em Portugal, foram produzidos cerca de 1,8 Mt de resíduos de plástico, tendo apenas cerca de 60% dessas sido recicladas. Estima-se que na União Europeia, 80-85% do lixo marinho seja constituído por plástico, representando um sério risco para os ecossistemas marinhos, a biodiversidade e a saúde humana, causando prejuízos a actividades como o turismo, as pescas e o transporte marítimo. A redução da poluição marinha requer ajustamentos nas opções de consumo individuais, de novas soluções baseadas no ecodesign de produtos e de políticas ambientais inovadoras.
2. Como considera que a região de Coimbra está a liderar com os microplásticos?
Estudos recentes comprovam a omnipresença de microplásticos no ambiente, incluindo rios, solo e ecossistemas marinhos. Estes resultam da degradação de partículas plásticas de maior dimensão, da abrasão de têxteis sintéticos durante o seu processo de lavagem, ou da utilização de produtos de higiene. Estima-se que 35% dos microplásticos nos oceanos sejam originados pela lavagem de têxteis sintéticos. Os microplásticos entram meio hídrico através da deposição atmosférica, do escoamento da água ou através das águas residuais urbanas, cujos sistemas de tratamento têm sido ineficazes, até ao momento, para os remover. É necessário promover políticas, regulamentação e incentivos que limitem a incorporação de microplásticos em produtos, promovam o desenvolvimento e adopção de novas tecnologias de tratamento de águas residuais e sensibilizem a sociedade para novos padrões de consumo. Um exemplo em Coimbra é o projecto “Make water cleaner” que visa desenvolver uma tecnologia para remover microplásticos das águas residuais.
3. Considera a região de Coimbra com um bom ambiente?
A Constituição da República Portuguesa consagra que todos temos direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado, mas também o dever de o defender, preservar e de respeitar, de forma a assegurar o desenvolvimento sustentável a longo prazo para as gerações futuras. Mas o que é o ambiente?
A Lei n.º 19/2014, de 14 de Abril, estabelece as bases da política de ambiente e define que o ambiente inclui não só os componentes naturais, como o ar, a água e o mar, a biodiversidade, o solo e o subsolo, a paisagem, os recursos naturais em geral e os bens e serviços que os ecossistemas nos prestam (produção de oxigénio pelas plantas, por exemplo), mas também componentes associadas a comportamentos humanos, como as alterações climáticas, a produção de resíduos ou a emissão de ruído.
A Agência Portuguesa do Ambiente publica todos os anos o Relatório de Estado do Ambiente (https://rea.apambiente.pt/), onde apresenta indicadores de qualidade ambiental à escala nacional. Contudo, este tipo de estudos não existe à escala regional, o que seria determinante para uma resposta objetiva para avaliar com rigor a qualidade ambiental da região de Coimbra.
4. Até que ponto a agricultura afecta o ambiente?
Nas últimas décadas a agricultura evoluiu de uma actividade local de subsistência para uma indústria global intensiva com o propósito de assegurar as necessidades alimentares do aumento exponencial da população. Em determinadas condições de produção, a agricultura pode gerar impactos ambientais negativos significativos, como a poluição do meio hídrico, a destruição da paisagem natural, a erosão e perda de solo fértil, a redução de biodiversidade, incluindo o declínio de insectos polinizadores. Contribui ainda para as alterações climáticas, sendo responsável pela emissão de 10% dos gases com efeito de estufa emitidos pela União Europeia.
Por outro lado, a agricultura está intrinsecamente associada a questões de segurança e soberania alimentar e os eventos geopolíticos mundiais recentes (como a invasão da Ucrânia pela Rússia) relançaram a discussão sobre a importância dessa soberania e da autonomia alimentar. Este é um desafio actual, sendo certo que a actividade agrícola, quando executada com recurso a técnicas mais sustentáveis, desempenha funções essenciais ao nível do ambiente, na promoção:
da saúde dos ecossistemas, pela gestão da interface entre as áreas humanizadas e o território mais natural, promovendo a gestão da paisagem, a regeneração do solo, a recarga dos aquíferos e a promoção da biodiversidade;
da qualidade ambiental e da mitigação das alterações climáticas, pela sua função essencial na captura de carbono e na produção de biomateriais;
do bem-estar das pessoas, na valorização da cultura e das tradições locais.
5. Que soluções/projectos a ESAC oferece na sustentabilidade do sector agrícola?
Além do ensino, na Agrária de Coimbra desenvolvem-se outro tipo de actividades, nomeadamente, investigação, apoio à comunidade, produção agrícola, pecuária e florestal, bem como transformação agro-alimentar com produção de diversos produtos inovadores.
Ao longo dos anos, a ESAC tem desenvolvido vários projectos que promovem a sustentabilidade da agricultura, sempre utilizando o seu campus como laboratório vivo de ensino, aprendizagem e investigação. Refere-se alguns exemplos:
17 hectares certificados em agricultura biológica;
desenvolvimento de técnicas de compostagem e produção de materiais orgânicos fertilizantes do solo;
desenvolvimento de técnicas de conservação e protecção da erosão do solo;
utilização de pastagens biodiversas enriquecidas com leguminosas;
selecção e conservação de variedades genéticas tradicionais e de animais de raças autóctones, perpetuando o património genético nacional;
adopção de práticas de protecção integrada;
desenvolvimento e utilização de técnicas 4.0 para optimizar a produção agro-pecuária;
utilização de práticas eficientes na rega para poupança de água e energia;
soluções de tratamento de efluentes inovadoras;
desenvolvimento de sistemas agrovoltaicos e de novos serviços de flexibilidade para os mercados de energia;
estreitamento da ligação da agricultura ao consumidor através de venda directa na Loja da Agrária e da promoção de circuitos curtos.
6. De que forma os cursos da ESAC preparam os estudantes para a protecção do meio ambiente?
A Agrária de Coimbra ministra actualmente cursos de nível superior (CTeSP, Licenciaturas e Mestrados) nas áreas de agricultura biológica, agro-pecuária, ambiente, biotecnologia, enfermagem veterinária, florestas, tecnologia alimentar, turismo em espaços rurais e naturais, caracterizados por uma forte componente profissionalizante e por uma ligação muito próxima ao tecido empresarial, a associações e cooperativas.
Embora a Licenciatura em Tecnologia e Gestão Ambiental e os Mestrados em Gestão Ambiental e em Desenvolvimento Sustentável sejam as ofertas mais relacionadas com as tecnologias de protecção ambiental, todos os cursos estão alinhados com a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável e a adopção dos 17 Objectivos de Desenvolvimento Sustentável.
Além disso, acreditamos que a imersão dos estudantes num “campus sustentável”, certificado como “Eco-Campus”, reconhecido internacionalmente pelas boas práticas de gestão ambiental e alvo de vários projectos de eficiência energética co-financiados por programas públicos, que fazem deste espaço uma referência, induz toda a comunidade académica a adoptar práticas e comportamentos mais sustentáveis.