O Grupo de Etnografia e Folclore da Academia de Coimbra (GEFAC) estreia na próxima semana “Para Lá da Terra”, um espectáculo com música, dança e teatro que explora a forma como a cultura popular portuguesa aborda a morte.
O espectáculo vai estar em cena nos dias 8, 9 e 11, às 22h00, no Teatro de Bolso, no edifício da Associação Académica de Coimbra.
O trabalho explora o tratamento da morte a partir das manifestações da cultura popular e tradicional portuguesa, disse à agência Lusa Carolina Rocha, do GEFAC.
“Se para poder morrer basta existir, o quotidiano e imaginário do povo português estão repletos de ritos e ditos que libertam os vivos da sua morada terrena, encomendam almas para que atravessem a suspensão do purgatório, trazem de volta, de tempos a tempos, a presença dos nossos mortos, para que ceiem connosco outra vez”, sublinhou o grupo.
O espetáculo está dividido em três quadros. Um primeiro centrado na vivência do luto, outro sobre cerimónias, como o velório, as encomendações de almas, martírios e representações das alminhas (a comida ou estátuas que se deixam em encruzilhadas para as almas não se perderem), e um terceiro centrado na percepção de como “a morte faz parte da vida e de como as cerimónias colectivas possibilitam que a vida avance”, explicou Carolina Rocha.
Num espectáculo sem história nem personagens, o GEFAC procura resgatar ritos que subsistem e que como que ‘fintam’ as tentativas de normalização dos rituais de luto por parte da Igreja Católica, referiu.
“No processo de pesquisa, estávamos à espera de encontrar manifestações de matriz religiosa, mas encontrámos, na maior parte delas, testemunhos que falavam de cerimónias que tinham uma raiz pagã e que foram adaptadas ou assimiladas”, realçou.
Carolina Rocha recordou um testemunho de Idanha-a-Nova em que, face à postura de um novo padre que recusava as encomendações aos mortos que o povo fazia, as letras foram adaptadas, para incluir Jesus, Maria ou o Espírito Santo. “Encontrámos desses exemplos por todo o lado”, sublinhou.
O espetáculo começou a ser preparado há dois anos, com um trabalho de pesquisa em fontes documentais, mas também à procura de testemunhos nas famílias dos membros do GEFAC, grupo que acaba por ter “gente de todo o lado” do país.
“Não queríamos que tivesse uma conotação pesada, de apenas tristeza profunda, mas de inevitabilidade, de um elemento que faz parte da vida”, vincou Carolina Rocha.