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Reportagem: Uma história de ouro na Baixa de Coimbra

28 de Maio 2023 Jornal Campeão: Reportagem: Uma história de ouro na Baixa de Coimbra

A histórica Baixa de Coimbra está repleta de estabelecimentos que cresceram junto com a cidade e tornaram-se um ponto de referência, seja pela sua longevidade, seja pela particularidade dos serviços oferecidos. A ilustrar isso mesmo, o “Campeão” contactou alguns desses estabelecimentos mais antigos, para com eles constituir um pouco da história comercial da cidade.

Um desses comércios, em particular, tornou-se uma verdadeira jóia para a região: a Ourivesaria Costa.

Fundada em 1936, a loja vai completar, em Novembro, 87 anos de existência. Ao longo dessas quase nove décadas, esta Ourivesaria ficou conhecida por diversos aspectos, como os anéis de curso, os acessórios em ouro e prata e os relógios.

Como explica o conhecido proprietário, José da Costa, este estabelecimento foi fundado por três senhores, sendo um deles profissional da ourivesaria: Manuel da Costa.

“O senhor Manuel da Costa foi um óptimo profissional e foi com ele que eu aprendi tudo que diz respeito à profissão. Ele era amigo do meu pai, mas não era nosso parente, por isso os nomes iguais foram apenas uma coincidência”, explica.

A trajectória de José da Costa com a Ourivesaria é quase tão antiga quanto a própria loja: começou a trabalhar no estabelecimento em 1943, quando tinha 12 anos. E, no dia 8 de Agosto, vai celebrar 80 anos neste espaço.

“Estas oito décadas foram boas. Comecei como marçano, um miúdo que ia ao correio, ao banco e fazia todas essas coisinhas. Passei do mais insignificante empregado para principal e, depois, do mais insignificante sócio para sócio principal”.

Por conta de todo o trabalho desenvolvido e por todo o percurso deste estabelecimento, a Ourivesaria Costa foi classificada, em 2022, como “Loja com História”, pela Câmara Municipal de Coimbra.

Nesse âmbito, o “Campeão” conversou com José da Costa para saber um pouco mais sobre a Ourivesaria mais antiga de Coimbra.

 José da Costa, proprietário da Ourivesaria Costa, e Adérito Cioga, colaborador da loja há 35 anos 

 

A Ourivesaria e a Universidade

Quando falamos sobre Coimbra não podemos deixar de mencionar a vida académica, um traço tão marcante e tão característico da cidade. Muitos espaços relacionam-se, de forma directa ou indirecta, aos estudantes. Com a Ourivesaria Costa não poderia ser diferente: uma das principais peças da loja são os anéis de curso.

A tradição de utilizar esses anéis depois de finalizar a licenciatura é conhecida não apenas em Coimbra, como em Portugal no geral, embora actualmente não se siga tão à risca esse costume.

“Na Ourivesaria, dedicamo-nos e continuamos a fazer os anéis de curso. No entanto, há uma menor procura nos dias de hoje, porque actualmente as pessoas já não pensam tanto nisso”, conta José da Costa. Entretanto, explica que ainda vende este tipo de artigo, sob encomenda, porque muitos familiares continuam a querer presentear os filhos, ou os netos, por exemplo, com os anéis.

Como manda a tradição, “o anel define o curso e o lugar onde foi feita a graduação”, explica José da Costa. Assim, a peça deve conter um desenho que represente a Universidade onde foi conncluído o curso (Coimbra é representada pela Torre) e, do outro lado, marcas que representem a licenciatura (Direito, por exemplo, é caracterizado com uma espada e uma balança). Depois, na parte de cima, é colocada uma pedra e, mais uma vez, a cor depende de qual foi a área da Licenciatura (azul escuro é para Letras, vermelho para Direito, amarelo para Medicina, e assim por diante).

“Os detalhes evidenciam a formação académica, se aconteceu no Porto, em Lisboa, Braga, ou Faro, entre outros locais. Em Coimbra, por exemplo, utiliza-se a Torre. Depois grava-se na peça os motivos da Faculdade (Medicina tem um desenho, Letras tem outro, etc) e, por fim, temos a pedra”.

No anel à esquerda é possível ver os motivos do curso gravados na lateral da jóia: a espada e a balança, bem como a pedra vermelha, ambos a representar Direito. Já na peça à direita, a pedra é azul escuro (Letras) e vê-se a Torre, a indicar tratar-se de Coimbra

 

Os anéis de doutoramento

Como explica José da Costa, o anel de doutoramento é diferente do de curso: não tem desenhos, leva apenas uma pedra com a cor da área de formação (a mesma dos anéis de curso) e é mais grosso.

“Essa peça chama-se anel de doutoramento; tem o mesmo ouro e a mesma pedra, mas não é gravado com desenhos”. Esta jóia, como conta o proprietário da Ourivesaria, tem ainda menos saída que o anel de curso. Antigamente ainda eram mais raros, porque poucas pessoas se doutoravam.

Em relação aos anéis de mestrado, José da Costa revela que “nunca apareceu ninguém a dizer que gostaria de um desse tipo, ou pedem para a licenciatura, ou para o doutoramento”.

 

Uma variedade de produtos

Como conta José da Costa, “em Coimbra não se fabrica ourivesaria”. Esta arte é apoiada por terras específicas, como Lisboa e Porto, duas cidades “indiscutivelmente” fortes nessa área.

No entanto, “hoje em dia há outras terras que fabricam, também, muito material”. 

Há, por exemplo, Gondomar, situado próximo do Porto, que é uma importante produtora de objectos de prata e de ouro. “Existem algumas outras regiões, mas estas três são as principais [Lisboa, Porto e Gondomar]”.

No entanto, há mais um local que merece destaque: o Minho. Esta região do Norte de Portugal é a responsável pela confecção de muitas peças tradicionais do país, como os corações minhotos e a filigrana (um trabalho feito com fios muito finos, normalmente de ouro ou de prata).

Assim sendo, a Ourivesaria Costa não produz as peças que estão à venda na sua loja, mas tem à disposição dos clientes uma grande variedade de objectos, como brincos, colares, pingentes, talheres (colheres, garfos, facas), bandejas, relógios (embora não seja o forte da casa) e muitos outros artigos.

Os que desejam (re)visitar este importante estabelecimento comercial podem fazê-lo, na conhecida rua Ferreira Borges, n.º 153, de segunda a sexta-feira, entre as 9h30 e as 13h00, e depois das 15h00 às 19h00. No sábado, o estabelecimento funciona apenas durante a manhã (9h30 às 13h00).

A Ourivesaria Costa tem à venda diversas peças em ouro e prata, como brincos, colares, pingentes e talheres (colheres, garfos, facas) e bandejas

 

Fernanda Paçó
»» [Reportagem da edição impressa do “Campeão” de 25/05/2023]