O reitor da Universidade de Coimbra (UC) recusou hoje divulgar os alegados “factos” que levaram à demissão do diretor do Centro de Estudos Russos, referindo que processo não teve nem teria de ter associado qualquer processo disciplinar.
A UC demitiu na quarta-feira o professor e diretor do Centro de Estudos Russos, Vladimir Pliassov, após este ter sido acusado de “propaganda russa” por dois cidadãos ucranianos a residir em Coimbra, num artigo de opinião publicado no Jornal de Proença.
Questionado hoje, o Reitor da UC, Amílcar Falcão, afirmou que não “tinha de haver nenhum processo disciplinar” para suportar a demissão do diretor do Centro de Estudos Russos da Faculdade de Letras, que se encontrava reformado e trabalhava a “título gracioso” naquela instituição.
“Houve uma rescisão de contrato de uma pessoa que está reformada. Tinha um vínculo, através de um contrato com a Universidade, mas a título gracioso. Não havia aqui dinheiro envolvido”, esclareceu o responsável, que falava à margem de uma cerimónia, na Sala do Senado, em Coimbra.
Questionado sobre se teve conhecimento da situação antes ou depois da denúncia, feita no final do dia de terça-feira, Amílcar Falcão recusou-se a dizer quando é que soube das acusações, vincando, no entanto, que não toma decisões “por impulso”.
“As minhas decisões são fundamentadas e têm sempre um tempo de amadurecimento. Portanto, aquilo que considero que seja essencial está no comunicado de imprensa da Universidade de Coimbra”, acrescentou.
O comunicado divulgado pela UC na quarta-feira apenas refere que foi verificado que as atividades do Centro de Estudos Russos “estariam a extravasar” o ensino exclusivo de língua e literatura russa, sem explicar como.
Amílcar Falcão disse que tem em sua posse “outro tipo de dados” e que “os factos são muito complexos”, mas escusou-se a explicar como, quando e onde a actividade daquele centro dirigido por Vladimir Pliassov extravasava a actividade letiva, remetendo sempre para o comunicado da instituição.
“Posso dar explicações à tutela e a outras entidades responsáveis. Publicamente, não vejo qual o interesse disso”, realçou.
O artigo assinado pelos ucranianos Olga Filipova e Viacheslav Medvediev acusa Vladimir Pliassov de “propaganda russa” na Universidade de Coimbra e de ser o principal representante em Portugal da fundação Russkiy Mir (instituição criada por Vladimir Putin e suportada por Moscovo, que tem como principal objetivo a promoção da língua e cultura russas).
Os dois “activistas” acusam o professor de utilizar símbolos conotados com a invasão do território ucraniano, como a fita de São Jorge, símbolo usado para celebrar a vitória da União Soviética contra a Alemanha Nazi, mas que no século XXI ganhou outra carga, estando associada a movimentos separatistas pró-russos tendo sido proibido em vários países da Europa de Leste.
Os autores mostram também fotografias de jovens (sem se perceber o seu contexto) com cartas onde se lê que são do “Sul da Ucrânia” ou da “República Popular de Donetsk”, como “entidades geográficas separadas e válidas”.
As imagens utilizadas pelos dois autores sobre o uso da fita de São Jorge e das cartas das jovens foram todas retiradas de um vídeo no canal de Youtube do Centro de Estudos Russos, publicado em fevereiro de 2018 (quatro anos antes do início da guerra na Ucrânia) e sem se conseguir perceber em que contexto, local ou data em que cada imagem foi publicada (o vídeo assume-se como uma espécie de foto ‘slide’).
Segundo a Universidade de Coimbra, com a invasão russa da Ucrânia, a Universidade de Coimbra cessou o vínculo que tinha com a fundação Russkyi Mir, “que até dezembro de 2021 apoiava o ensino de língua e cultura russa no Centro de Estudos Russos da Faculdade de Letras”.
“Em respeito pelo povo e pela cultura da Rússia, após o corte dessa ligação contratual, o referido Centro de Estudos Russos foi mantido em funcionamento, com recursos próprios da UC, para ensino exclusivo de língua e literatura russa”, esclareceu.
Na mesma nota de esclarecimento, a Universidade de Coimbra (UC) salienta que é uma “instituição profundamente comprometida com os valores europeus e totalmente solidária com a Ucrânia no contexto da agressão russa”.
Até ao momento, não se conseguiu obter esclarecimentos junto de Vladimir Pliassov.