José Luís Marques, director da Escola de Hotelaria e Turismo de Coimbra, é um profissional experiente da Educação e Formação Profissional, tendo trabalhado nessa área durante toda a sua carreira. Nesta entrevista falou-nos sobre a Escola de Hotelaria e Turismo, bem como os desafios que o sector enfrenta.
Campeão das Províncias [CP]: O que é a Escola de Hotelaria e Turismo de Coimbra?
José Luís Marques [JLM]: A Escola de Hotelaria e Turismo de Coimbra é uma instituição que oferece cursos de formação profissional nas áreas de hotelaria, turismo e restauração desde 1989. Os cursos são destinados a estudantes do ensino secundário, mas também oferece especializações (CET) em áreas como cozinha, pastelaria, restaurante-bar, gestão hoteleira, turismo de natureza e aventura, e turismo cultural e património para jovens e adultos que já concluíram o ensino secundário, bem como formação contínua para colaboradores do sector de turismo. No próximo ano, a escola irá incluir o curso de técnico de alojamento hoteleiro na sua oferta formativa.
[CP]: A Escola de Hotelaria e Turismo de Coimbra é uma entidade privada?
[JLM]: Nós somos uma rede de escolas de hotelaria e turismo que pertencem ao Turismo de Portugal, que é um órgão público. Estamos sob a supervisão do Ministério da Economia do Mar e contamos com 12 escolas distribuídas da seguinte forma: Viana do Castelo, Porto, Lamego, Coimbra, Oeste (Caldas da Rainha/Óbidos), Portalegre, Lisboa, Estoril, Setúbal, Portimão, Faro e Vila Real de Santo António.
[CP]: Quais são os maiores desafios da vossa Escola?
[JLM]: A Escola de Hotelaria e Turismo tem como objectivo oferecer uma formação excepcional, com as melhores instalações e formadores. Apesar da capacidade para 300 alunos, começámos o ano com 220 alunos, devido à menor procura e a questões relacionadas com as condições de trabalho. A área de hotelaria e turismo tem alta empregabilidade, mas ainda há escassez de profissionais qualificados, levando algumas empresas a contratar pessoas sem experiência e a formá-las no trabalho, o que pode afectar a qualidade do serviço.
[CP]: É caro frequentar a Escola de Hotelaria e Turismo?
[JLM]: Até quatro ou cinco anos atrás os alunos precisavam pagar uma mensalidade na escola devido ao alto custo dos cursos. Como somos uma instituição pública e o ensino secundário é considerado a educação mínima obrigatória, não podíamos mais cobrar essa taxa. No entanto, mesmo nessa altura tínhamos um programa de apoio social que garantia que todas as famílias pudessem receber ajuda, dependendo dos seus rendimentos. Essa ajuda variava de isenção total da mensalidade a 50% de redução da propina. Actualmente, apenas os cursos pós-secundários são pagos e exigem uma mensalidade. No entanto, esses cursos também têm vários programas de apoio social, incluindo isenção da mensalidade e outros subsídios para alojamento, alimentação e transporte.
[CP]: O local de residência não é impeditivo de frequentar a vossa Escola?
[JLM]: Temos um processo de selecção e admissão que se assemelha aos concursos universitários nacionais, pois os alunos naturalmente concorrem para a escola e curso de sua escolha como primeira opção. No entanto, a admissão é baseada nos resultados de classificação nacional, o que permite que os alunos tenham a opção de escolher uma segunda e terceira opção, se necessário. Actualmente, com menos procura, a colocação na primeira opção é mais fácil, mas é importante ressaltar que o curso de Gestão e Produção de Cozinha é altamente procurado em todo o país e tem as suas vagas preenchidas com frequência.
[CP]: A que é que se deve a menor procura por estes cursos?
[JLM]: É importante lembrar que estamos a enfrentar um Inverno demográfico que está a afectar as faixas etárias que frequentam as escolas e o ensino superior. A pandemia levou a uma diminuição significativa no número de nascimentos, o que terá um impacto no futuro. Há muita competição entre as instituições de ensino, o que significa menos alunos disponíveis para recrutar. A incerteza em relação ao futuro nestas profissões também levou muitos a abandonar a área, resultando na falta de pessoal qualificado. Os níveis salariais continuam baixos, e é necessário mudar algo em relação à organização do trabalho, como implementar horários directos para melhorar a situação. É necessário criar condições atractivas para que esses profissionais voltem à área e para atrair e reter talentos.
[CP]: Mas esta área possibilita grandes progressões de carreira?
[JLM]: A perspectiva de progressão na carreira é uma das grandes atracções no sector. Muitos dos nossos alunos, tanto na nossa escola quanto na nossa rede de escolas, tornaram-se directores e experimentaram uma melhoria salarial significativa. Neste aspecto a Hotelaria e o Turismo é um dos sectores mais atraentes que existem no mercado do trabalho.
[CP]: O sector da hotelaria e do turismo tem crescido em Portugal?
[JLM]: O país tem políticas muito eficazes para atrair visitantes, o Instituto do Turismo de Portugal tem investido fortemente na promoção internacional desde 2008, incluindo através de canais digitais. Portugal é um destino turístico de qualidade reconhecido mundialmente, tendo registado um crescimento constante até 2019, com recordes sucessivos. No entanto, a pandemia interrompeu essa trajectória em 2020 e 2021. Acredita-se que a retomada aos níveis de 2019 poderia ocorrer em 2022 ou nos próximos anos, mas na realidade, já em 2022, tivemos novamente um recorde em termos de visitas e principalmente em dormidas, que são os números mais importantes em termos de resultados turísticos e receitas provenientes do turismo. Para manter essa tendência, é fundamental apresentar a melhor qualidade possível.
[CP]: Portugal tem capacidade para manter essa tendência de crescimento?
[JLM]: A estratégia do Turismo de Portugal, que é que é autoridade máxima para o efeito, é focada num crescimento sustentável e de qualidade em toda a cadeia de valor turístico do país. Um factor crucial é a consideração dos residentes locais, pois o turismo não deve prejudicar as condições habitacionais da comunidade.
[CP]: Coimbra tem dificuldade em prolongar as estadias dos visitantes.
[JLM]: É difícil mudar as rotas turísticas estabelecidas. Embora a Universidade seja um grande atractivo da cidade, especialmente depois de ter sido classificada pela UNESCO em 2013, isso ainda não tem sido suficiente para aumentar significativamente o tempo médio de estadia dos visitantes na cidade. Embora a universidade esteja a fazer um trabalho excelente no que diz respeito ao turismo e esteja a gerar receita, o problema persiste há décadas, já que os visitantes ainda não passam mais de uma noite na cidade. Precisamos trabalhar em conjunto com as instituições locais e regionais para combater essa tendência. É crucial planear e organizar esforços, algo que tem sido discutido há algum tempo na nossa cidade, mas ainda não foi efectivado de forma eficaz. Isso é comprovado pelos números, que mostram que ainda não estamos a ter sucesso nessa área.
[CP]: A Escola de Hotelaria e Turismo tem tido intervenção a este nível?
[JLM]: A nossa escola procura ser activa nessas questões e, além de sermos convidados por diversas instituições, também temos os nossos próprios fóruns. Na próxima quarta-feira, dia 15, realizaremos a terceira reunião da Comissão Regional para a Formação em Turismo, que é um órgão consultivo com a presença de todos os agentes da cidade e da região. O foco será apresentar um estudo encomendado pelo Turismo Portugal à Universidade de Aveiro sobre o sector do turismo. O estudo inclui entrevistas e questionários realizados com cerca de 5.000 pessoas, entre profissionais e alunos, sobre as expectativas de trabalho neste sector.
[CP]: Realizaram a Semana Aberta, o que é isso?
[JLM]: A Escola de Hotelaria e Turismo teve uma semana aberta para apresentar a instituição à comunidade. O objectivo foi atrair novos alunos, incluindo aqueles que estão no final do ensino básico ou no ensino secundário, oferecendo diversas actividades para experimentarem. A escola recebeu visitantes de várias escolas da cidade e região durante cinco dias.
[CP]: Quais são os principais problemas que estes futuros trabalhadores enfrentam?
[JLM]: As mudanças precisam acontecer no mercado de trabalho e as empresas sabem disso. Essas mudanças podem incluir alterações nos horários e na organização do trabalho, no entanto, a conjuntura actual não é favorável para certas mudanças culturais e económicas necessárias. As empresas são muito penalizadas pelas diversas crises nacionais e internacionais e pela carga fiscal que têm de suportar. É importante destacar, ainda assim, que as empresas devem prestar mais atenção aos jovens qualificados. É importante que as empresas reconheçam o investimento dos jovens qualificados que passam pelas escolas, oferecendo-lhes salários e condições de trabalho adequados.
Lino Vinhal/ Joana Alvim