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Semanário no Papel - Diário Online

 

João Pinho

Da castanha aos magustos

25 de Novembro 2022

A castanha deriva do latim castânea. Trata-se de um fruto comestível, abundante em Portugal, cuja árvore, o castanheiro, espontânea e de grandes dimensões, da família das fagáceas, produz também madeira muito apreciada para mobiliário e aquecimento.

Os conjuntos de castanheiros, também designados por soutos ou soitos, precisam de condições climáticas muito próprias para se desenvolverem, em ambientes secos e frios, que em Portugal se encontram, sobretudo, nas altitudes mais elevadas, motivo pelo qual a produção nacional se concentra no interior montanhoso das regiões do Norte e Centro do país.

As origens do magusto são antigas e a própria palavra tem uma origem obscura. Sabemos, contudo, que se relaciona com o hábito que certos jovens tinham, no dia de S. Martinho, de irem apanhar castanhas, em grupos, para depois fazerem um magusto.

Com o tempo a festa profana foi-se enraizando, realizada em novembro, muitas vezes ao ar livre, por alturas do dia de Todos os Santos e dia de S. Martinho, em que se assam castanhas, preferencialmente, na brasa, bebendo-se água-pé, jeropiga ou vinho abafado.

As castanhas foram, também, a base da alimentação durante séculos, de que encontramos registos diversos na documentação que se conservou até aos nossos dias. O peru recheado com castanha, por exemplo, era um prato forte do dia de Natal, enquanto a sopa de castanhas constituía um prato corrente.

Porém, a castanha foi perdendo expressão a partir de um momento fundamental, que se deu com a introdução da batata, originária da América, em Portugal, em meados do século XVIII, revolucionando a agricultura e os hábitos alimentares, cujo cultivo se iniciou, precisamente, numa zona de excelência da produção da castanha: Trás-os-Montes e Beiras.

A batateira, menos exigente do que o castanheiro, não só ao nível dos solos e clima, mas também, por exemplo, do aturado trabalho de descasque da castanha dos ouriços, associado a doenças, como a tinta, que dizimou vários castanheiros e continua uma ameaça, fizeram com que a castanha fosse substituída, a pouco e pouco, pela batata – actualmente fundamental na nossa culinária, em pratos como o bacalhau assado com batatas a murro.

O recuo na produção da castanha e do cultivo de castanheiros, que compreende diversas espécies, veio a desencadear um fenómeno recente. Perante a lei da oferta e da procura, associada à sazonalidade da produção, a castanha tornou-se um produto gourmet, que de ano para ano é vendida cada vez a preços mais elevados, este ano acentuados pela crise económica e inflação associada.

(*) Historiador e investigador