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Carta Gastronómica da Região de Coimbra integra 114 receitas de 19 municípios

23 de Abril 2022

A Carta Gastronómica da Região de Coimbra, que foi apresentada hoje (23), integra 114 receitas e quer salvaguardar e promover a gastronomia e os produtos endógenos dos 19 municípios que compõem a Comunidade Intermunicipal da Região Centro (CIM-RC).

Coordenada pela investigadora em patrimónios alimentares Guida Cândido, especialista em História da Alimentação, a Carta, editada em livro pela CIM-RC, vai do mar à serra e dos territórios rurais aos urbanos, em 10 grupos de receitas.

Assim, há pratos do mar (e pratos do fiel amigo, o bacalhau), pratos do rio, do açougue, da matança e da fermentação, e também da capoeira, da horta, do açúcar e do grão e farinha.

“Mais interessante do que os colocar por ordem alfabética de município, faz muito mais sentido ordenar pela origem dos produtos, porque o que está em causa é o território, a sua identidade territorial e geográfica, estando cada município, obviamente, identificado”, disse Guida Cândido.

Contactada pela CIM-RC para fazer a coordenação da obra há cerca de dois anos, a investigadora aferiu e validou os conteúdos indicados pelos 19 municípios da Região de Coimbra.

“Eu coordenei os conteúdos que os municípios entenderam ser as suas referências na identidade gastronómica. Não fui indicar a cada município qual o património deles, porque eles é que sabem qual é, mas servi de aferidor”, explicou.

Guida Cândido acrescentou que a Carta Gastronómica – que surge como um “documento estruturante” no âmbito da Região de Coimbra como Região Europeia de Gastronomia 2021/2022 – “não é uma carta fechada, é uma carta aberta, com capacidade e elasticidades para crescer”, sendo, nesta primeira edição, limitada a seis receitas “identitárias” por município.

“São seis pratos que cada município considera corresponder à matriz do seu património alimentar. Sem qualquer barreira de ter de incluir doçaria, ou entradas, ou o que for, mas sim ser fiel ao território”, enfatizou.

Apresentada, curiosamente, no Dia Mundial do Livro, a Carta Gastronómica não apresenta 114 receitas distintas umas das outras, havendo pratos que se repetem, embora com nuances ou práticas diferentes na sua conceção.

“Não deixei de duplicar, triplicar, quadruplicar, aceitar uma multiplicidade de municípios a mostrar a mesma receita. Porque cada uma delas acaba por ter uma abordagem diferente”, frisou Guida Cândido.

“Não se pode ter a pretensão de que só se come algo num determinado município, há práticas comuns. Se pensarmos nos campos do Mondego, não é só em Montemor-o-Velho que se comem pratos com arroz. E se o arroz-doce é um património comum da Região Centro, o arroz-doce de Coimbra não é o de Mira, que já tem as gemas de ovos. Mais importante do que ter 114 receitas diferentes, é ter 114 receitas que também mostrem as semelhanças e essa ligação territorial”, afirmou a investigadora.

O secretário executivo da CIM-RC, Jorge Brito, destacou que a Carta Gastronómica é “mais uma iniciativa englobada na Região Europeia da Gastronomia 2021-2022”, pretendendo “qualificar as pessoas, o território e criar valor”.

“Mais do que fazer eventos, é criar esta valorização patrimonial”, indicou, considerando que a Carta “é um trabalho de preservação da memória coletiva”.

“Ir às raízes, aceder a acervos históricos para não se perder aquilo que é o património identitário através da cozinha”, sublinhou Jorge Brito, frisando que a obra espelha “não uma lógica administrativa [de cada município], mas aquilo que é o território”.

A Carta, indicou o responsável da Região de Coimbra, irá ficar disponível ao público “quer do ponto de vista físico, quer digital”, e será “matéria-prima para trabalhar um conjunto de acções subsequentes”, através, por exemplo, da introdução do receituário em restaurantes “que sirva de atractivo a que as pessoas venham ter uma experiência [gastronómica] no território da Região de Coimbra que não têm em mais lado nenhum”.

Entre outras iniciativas, serão produzidos tutoriais, nomeadamente conteúdos em vídeo, para ensinar a fazer as receitas.

Jorge Brito avisou, no entanto, que a dimensão da gastronomia “é um fim de linha”.

“Ninguém consegue valorizar este património, se não tiver todo o processo a montante de ter os produtos”, frisou.

Aludindo à Semana da Chanfana, em Miranda do Corvo, onde a Carta Gastronómica foi apresentada, Jorge Brito sublinhou que “ninguém consegue cozinhar chanfana se não tiver gado”.

“E é essa cadeia toda de valorização dos produtos a montante e da nossa agricultura, olhando sempre para a gastronomia, que temos de preservar, numa tentativa de ajudar o sector privado”, notou.