“Comprei um veículo híbrido que consumiria, ao que anunciavam, 3,8 litros/100 Km, a velocidade regular.
O facto é que o consumo era sempre da ordem dos 6 / 7 litros, a velocidade constante de 120 Km.
O que quero é exigir responsabilidades ao concessionário ou à própria marca e não sei como. Poderei anular o contrato”?
Cumpre apreciar os factos e oferecer a solução que se nos afigura a que mais se compagina com o que as leis estabelecem.
A situação em análise é, na verdade, susceptível de configurar
– uma prática negocial desleal (enganosa),
– eventualmente publicidade enganosa ou
– contrato celebrado com base em erro sobre as qualidades da coisa.
Enquadra-se, no entanto, tanto quanto se nos afigura, no âmbito das hipóteses de não conformidade da Lei das Garantias dos Bens de Consumo (alínea d) do n.º 2 do artigo 2.º):
“Presume-se que os bens de consumo não são conformes com o contrato se se verificar algum dos seguintes factos:
…Não apresentarem as qualidades e o desempenho habituais nos bens do mesmo tipo e que o consumidor pode razoavelmente esperar, atendendo à natureza do bem e, eventualmente, às declarações públicas sobre as suas características concretas feitas pelo vendedor, pelo produtor ou pelo seu representante, nomeadamente na publicidade ou na rotulagem”.
A ser assim, como parece, o consumidor teria dois meses para denunciar a não conformidade, após detectar as diferenças, de acordo com o que estabelece o n.º 2 do artigo 5.º – A da aludida lei:
“Para exercer os seus direitos, o consumidor deve denunciar ao vendedor a falta de conformidade num prazo de dois meses, caso se trate de bem móvel”…
E dentro dos dois anos contados da entrega da coisa, já que esse é o prazo de garantia dos bens móveis, consoante o n.º 3 do enunciado artigo:
“Caso o consumidor tenha efectuado a denúncia da desconformidade, tratando-se de bem móvel, os direitos atribuídos ao consumidor nos termos do artigo 4.º caducam decorridos dois anos a contar da data da denúncia”…
E, de entre os remédios de que o comprador podia lançar mão, o da extinção do contrato figura como adequado à circunstância: podia, pois, pôr termo ao contrato, devolvendo o veículo e exigindo a restituição do montante pago ou o cancelamento do crédito concedido.
Uma vez que a reparação do automóvel não parece satisfazer os interesses em presença. Tão pouco a sua substituição ou a redução adequada do preço. Que são os mais remédios previstos na lei.
Independentemente da indemnização a que houver lugar pelos danos eventualmente causados ao comprador.
Mas o consumidor só pode agir contra o concessionário, que não contra o fabricante.
Poderia eventualmente “voltar-se” contra o fabricante, de harmonia com o n.º 1 do artigo 6.º da lei, nestes casos:
“Sem prejuízo dos direitos que lhe assistem perante o vendedor, o consumidor que tenha adquirido coisa defeituosa pode optar por exigir do produtor a sua reparação ou substituição, salvo se tal se manifestar impossível ou desproporcionado tendo em conta o valor que o bem teria se não existisse falta de conformidade, a importância desta e a possibilidade de a solução alternativa ser concretizada sem grave inconveniente para o consumidor.”
Só – e tão só – para exigir a reparação ou a substituição da coisa.
O que não é patentemente o caso!
Presidente da apDC- DIREITO DO CONSUMO – Coimbra