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Semanário no Papel - Diário Online

 

Marcos Júlio

Avante, camaradas, rumo à descrença total

2 de Setembro 2020

Festa do Avante

A Ti Madalena “padeira” era provavelmente a velhinha mais carismática da minha aldeia.

Como a própria alcunha indica, era ela quem revendia (quase) todo o pão consumido no povo. Logo pela manhã era um corropio de canalha (eu incluído) em busca do pão fresco que, generosamente barrado com manteiga, era uma verdadeira delícia… hummmm!

Mulher de poucas letras, tinha sempre uma brejeirice na ponta da língua que animava os nossos dias; estava sempre bem disposta e contagiava-nos de boa disposição.

Era, também, uma mulher temente a Deus; católica praticante, não faltava à missa semanal.

Todos os anos em Setembro, a Ti Madalena rumava a sul para visitar a festa do Avante, de onde regressava alegre e jovial: “ai filhos, aquilo é que é uma festa bonita!”

Enquanto viva, não falhou uma!

E no Domingo seguinte lá estava ela na missa local, imperturbável aos comentários que o pároco tecia às ideologias dissonantes. A sua fé era mais forte que as palavras, e as tiradas indirectas resvalavam na firmeza das suas convicções.

E eu admirava-a e respeitava-a também por isso (e também porque bem sabia que ela não comia criancinhas – eu era o exemplo disso!)

Já os actuais dirigentes do PCP não entendem nem alcançam o sentimento generalizado da população.

Não compreendem que a realização do Avante este ano é um desrespeito por aqueles que tiveram de fazer confinamento e quarentena, por aqueles que não puderam passar a Páscoa em família, aqueles que hoje não podem visitar os familiares nos lares, ou residentes em outros países; pelos adeptos que não podem assistir aos eventos desportivos, pelos festivaleiros que não puderam atender festas e festivais de Verão, pelos artistas que não conseguem actuar, pelos organizadores de espectáculos que não puderam realizar-se, pelos que morreram vitimas da COVID-19, muitos dos quais contaminados de uma forma assim leviana; enfim, tantos e tantas que viram a sua vida desmoronar e ainda sofrem consequências.

Os dirigentes comunistas parecem não querer perceber que o risco não está na concentração dos seus festivaleiros, mas sim no seu regresso às origens, que pode ser em qualquer ponto do país. É o movimento de massas, a deslocação das pessoas que está em causa e que constitui perigo relevante para todos os cidadãos. Basta que um regresse contaminado ao Minho ou ao Algarve para dar início a uma cadeia de contágio que não se sabe onde irá parar. E se alguma infelicidade se vier a verificar, o PCP nunca mais recuperará credibilidade.

Para fazer a sua prova de vida, o PCP está disposto a esbanjar o apreço e a simpatia de muitos que não sendo militantes lhe confiavam o seu voto. Até mesmo os habitantes locais se opõem à realização do evento este ano.

Ao colocar-se ao nível daqueles que critica, o PCP perde a consideração e o apreço de todos.

Se a Ti Madalena fosse este ano à festa do Avante, também perderia toda a minha admiração e respeito…

(*) Jurista