O Ministério da Cultura vai abrir um processo de classificação da obra fonográfica do músico José Afonso, como “conjunto de bens móveis de interesse nacional”.
Esta é a primeira vez que a Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC) inicia um processo de classificação de uma obra fonográfica, revelou o Ministério da Cultura em comunicado, na véspera de se assinalar o 91.º aniversário do nascimento de José Afonso.
Segundo a tutela, o processo de classificação ajudará a “consolidar informação relativa à obra gravada, publicada ou não, do artista”.
A decisão, hoje anunciada, surge um ano depois de o parlamento ter aprovado um projecto de resolução do Partido Comunista Português (PCP) que recomendava ao Governo a classificação da obra de José Afonso como de interesse nacional, com vista à sua reedição e divulgação.
Há um ano, também a Associação José Afonso (AJA) reuniu mais de 11 000 assinaturas numa petição pública que apelava à mesma decisão.
Na altura, em nota divulgada à Lusa, a família de José Afonso, detentora dos direitos da obra musical, manifestava o apoio à classificação da obra e recordava que estava a “colaborar directamente com o Ministério da Cultura, desde 2018”, para que se desenvolvesse o processo.
“Espera-se que este processo resulte, não apenas no reconhecimento oficial da importância maior desta obra, mas também na sua eficaz protecção e preservação para as gerações vindouras”, sustentou a família.
Ainda em 2019, a ministra da Cultura, Graça Fonseca, afirmava publicamente que não foi por falta de vontade que o processo de classificação não se iniciou mais cedo, mas porque não existia acesso às ‘masters’ e ao conteúdo das gravações originais de José Afonso.
Quando foi lançada a petição de pedido de salvaguarda, o presidente da AJA, Francisco Fanhais, explicava que se estava perante “um imbróglio jurídico”, porque a Movieplay, a editora que detém os direitos comerciais da obra de José Afonso, estava “em situação de insolvência” e não se sabia “do paradeiro dos ‘masters’ das músicas gravadas pelo Zeca Afonso”, comprometendo a sua reedição.
Com a decisão de abertura do processo de classificação, o Ministério da Cultura afirma, hoje, que “ficam também criadas as possibilidades técnicas e processuais para que qualquer cidadão possa, a partir de agora, propor a classificação de um bem ou de um conjunto de bens fonográficos”.
Segundo a tutela, a possibilidade de se poder classificação um bem fonográfico faz parte de uma estratégia para o património sonoro, da qual constam medidas como “a criação de bases legais e técnicas relativas ao património sonoro, como é o caso do Arquivo Nacional do Som”.
José Afonso nasceu em 02 de Agosto de 1929, em Aveiro, e começou a cantar enquanto estudante em Coimbra, tendo gravado os primeiros discos no início dos anos 1950 com fados de Coimbra, pela Alvorada, “dos quais não existem hoje exemplares”, refere a associação na biografia oficial do músico.
“Voz de um povo sofrido, voz de denúncia, voz de inquietude. Voz sinete da revolução de Abril”, como descreve a AJA, José Afonso gravou álbuns como “Cantares do Andarilho”, “Traz Outro Amigo Também”, “Cantigas do Maio”, “Venham Mais Cinco” e “Coro dos Tribunais”.
Autor de “Grândola, Vila Morena”, uma das canções escolhidas para anunciar a revolução de Abril de 1974, José Afonso morreu a 23 de Fevereiro de 1987, em Setúbal, de esclerose lateral amiotrófica, diagnosticada cinco anos antes.
Amanhã (02), dia em que José Afonso completaria 91 anos, será descerrada uma estátua em tamanho real do cantautor em Belmonte, por lá ter vivido em jovem.