Várias organizações de produtores de mel calculam que a colheita com denominação de origem protegida (DOP) e outros da Serra da Lousã à base de urze vão ter quebras na ordem dos 80 por cento.
António Carvalho, presidente da Lousãmel – Cooperativa Agrícola dos Apicultores da Lousã e Concelhos Limítrofes informou que as baixas de produção estão entre os 75 e 85 por cento.
Na opinião do presidente, “não há dúvida nenhuma” de que o maior decréscimo da produção das últimas décadas é uma consequência da instabilidade climatérica verificada na Primavera.
Devido à chuva persistente, em Maio, “a flor da urze ficou muito lavada”, disponibilizando menos néctar e pólen, a que se seguiu “um calor terrível”, admitiu o dirigente da Cooperativa.
Entretanto, as abelhas tiveram necessidade de consumir algum mel já acumulado e “só na segunda quinzena de Junho é que entrou mais algum”, adiantou António Carvalho.
Segundo o apicultor idênticas quebras de produção deverão em geral registar-se em todo o país, “dependendo de região para região”.
Nos últimos anos, também a Cooperativa Social e Agro-Florestal de Vila Nova do Ceira, no município de Góis, tem apostado na apicultura, tanto no apoio à produção, como na formação de sócios e demais interessados.
Domingos Alves, que possui apiários na Serra da Lousã e na Figueira da Foz, bem como no Ribatejo e no Alentejo, é o responsável técnico de um projecto da cooperativa de Vila Nova de Ceira que inclui a apicultura.
“Desta vez, temos quebras de produção de 80 por cento no mínimo”, sublinhou o apicultor, que desenvolve a sua actividade a partir de Castanheira de Pêra, onde reside, no distrito de Leiria.
Apesar das baixas produções, o mel da Serra da Lousã, onde um número significativo de produtores opta pela não certificação, deverá este ano cumprir os padrões médios de qualidade, designadamente quanto à composição química, cor, gosto e textura, prevê Domingos Alves.
Em 2019, pelo contrário, “o mel não foi de excepcional qualidade”, ainda que as colheitas tenham sido mais satisfatórias, acrescentou.
No Sul de Portugal, “ainda vai haver algum mel”, de rosmaninho, de eucalipto e multifloral, mas na Serra da Lousã “o ano é péssimo”, lamentou.
A urze é a planta arbustiva predominante na montanha, embora sofra actualmente a concorrência de espécies exóticas e invasivas, como o eucalipto e a mimosa, além do flagelo dos fogos que, associados às alterações climáticas, têm vindo a dizimar extensas manchas da floresta autóctone, incluindo castanheiros e carvalhos que contribuem para a qualidade única do mel da região.
Também na Pampilhosa da Serra, cujo presidente da Câmara, José Brito, tem ligações à actividade apícola, tendo chegado a presidir à assembleia geral da Lousãmel, as colheitas de mel de urze já começaram e “estão a ser muito fracas”, afirmou Luís Estêvão, presidente da Pampimel – Cooperativa de Apicultores e Produtores de Medronho.
Dos 75 sócios da Cooperativa, alguns “são muito experientes e não se lembram de um ano tão fraco”, adiantou.
A qualidade, no entanto, melhorou, três anos depois dos grandes incêndios de 2017, que devastaram o concelho da Pampilhosa da Serra.
“A produção é francamente má, mas voltámos a ter mel de urze”, já que o coberto vegetal tende a recompor-se dos fogos, explicou.
Luís Estêvão recordou que, no ano passado, “o mel era mais multifloral e claro, com pouca quantidade de urze”, cuja flor concede ao produto a tonalidade escura e o sabor adstringente.
Os sócios da Pampimel têm agora produções “pelo menos 70 por cento mais baixas em relação a um ano médio”, de acordo com o mesmo dirigente, que explicou ainda que a maioria das explorações locais são de pequena dimensão e os donos “não se dedicam a tempo inteiro” a esse trabalho.
“Noventa por cento dos associados vendem o mel à porta e não fazem a sua certificação”, declarou Luís Estêvão. As condições atmosféricas, especialmente o frio em maio, condicionaram as produções de mel ao mínimo, disse.
A directora executiva da Lousãmel, Ana Paula Sançana, corroborou que “as perspectivas são altamente dramáticas” para a colheita – a chamada cresta – deste Verão, que ainda não começou em vários concelhos.
“Muitos produtores nem sequer vão certificar o mel, pois verifica-se uma autêntica razia”, sublinhou, realçando que as quebras não foram originadas “por défice de maneio ou alimentação”, mas sim pelo clima.
“Vão ser necessárias medidas para apoiar estes produtores”, concluiu a dirigente.