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Semanário no Papel - Diário Online

 

Sónia Messias Pereira

Eu estive em casa

9 de Abril 2020

Varanda Francisco

 

Foram três semanas em casa. Não porque quisesse ou precisasse de descansar. Mas porque fui, como tantos outros, obrigada a isso pelas circunstâncias. Este inimigo invisível chegou e virou a vida de todos de pernas para o ar. Certo que veio com aviso, mas, ainda assim, ninguém estava preparado.

Foram três semanas em casa. Não foram férias. Não foi descanso. Não foi o desligar de tudo para depois recomeçar. Confesso que os primeiros dias, com o meu filho de dois anos, foram gratificantes. Foram reconfortantes até. Tinha saudades de ter tempo para ele. Parecia que o mundo lá fora não nos dizia respeito. Mas afinal dizia. E muito.

Houve dias em que as brincadeiras, os cozinhados, as arrumações fizeram o tempo voar. Outros houve, tantos outros, em que a preocupação, o nervosismo, a ansiedade quase me fizeram desesperar por estar fechada entre aquelas quatro paredes. Principalmente de cada vez que as notícias me chegavam.

A preocupação por não saber o que iria acontecer a nível profissional e não poder ajudar. O nervosismo por “ver” o que acontecia lá fora e mesmo assim saber que na rua, em trabalho, andava o meu marido, o pai do meu filho, que no fim daquele dia voltaria a casa sem sabermos se infectado ou não. A ansiedade por não saber onde tudo vai parar. E houve, também, alturas em que a tristeza se apoderou de mim. De cada vez que o meu filho, sem entender o que está a acontecer, me pedia para irmos brincar à rua, para ir à escola, para ver os avós ou os amigos e eu simplesmente lhe dizia que não podia.

E a frustração? Essa também apareceu algumas vezes. Frustração por não poder trabalhar. Frustração por estar ali, em casa, e através da janela ver tantas e tantas pessoas que passeiam como se nada fosse.

Foram dias difíceis que estão longe de terminar. Já não estou em casa, por enquanto, mas está tudo muito longe de chegar ao fim. E essa meta, que ainda nem se vê, vai afastando o pensamento positivo que teimamos em mostrar. Porque sim, tudo vai passar. Mas não, não vai ficar tudo bem.

Não vai ficar tudo bem para aquele que perdeu um familiar. Não vai ficar tudo bem para aquele que perdeu o emprego. Não vai ficar tudo bem para aquele que não conseguiu recuperar a sua empresa. Não vai ficar tudo bem. Mas tudo vai passar!