Perfil publicado a 12 de Dezembro de 2019, na edição n.º 1002
Nome: JOÃO Albino Rainho ATAÍDE das Neves
Naturalidade: Figueira da Foz
Idade: 61 anos
Profissão: Juiz Desembargador em licença sem vencimento; Deputado do PS eleito pelo círculo eleitoral de Coimbra
Passatempos: Jogar golfe; natação; ler; cozinhar
Signo: Peixes
Tinha 16 anos quando a Liberdade chegou ao país mas viveu, desde sempre, os ideais do 25 de Abril, quer através das precoces leituras de cariz político (as crónicas de Sá Carneiro ou a literatura de Mário Soares), ou até mesmo das vivências no seio familiar, com um pai sempre preocupado em que os filhos fossem para a Guerra Colonial.
Existiam em casa, aliás, tertúlias permanentes de orientação liberal e uma dinâmica libertária na escola que frequentava, com grande formação política, como era característico daquela época.
Nasceu na Figueira da Foz, mas acompanhou os pais até Aveiro em 1960, apenas com dois anos de idade, na altura em que o pai é colocado no tribunal judicial de Vagos. Por lá ficou durante cerca de nove anos, concluindo a escola primária e o primeiro ciclo nessa cidade. Sai de Aveiro “numa viagem difícil até Coimbra porque lá tinha os amigos de infância e estes são aqueles que não questionamos, que ficam para a vida”, explica.
Já em Coimbra, passou pelo, à época, Liceu D. João III (actualmente, Escola Secundária José Falcão) e depois pela Escola Secundária Infanta Dona Maria que, entretanto, se tornara mista. E esse ano foi para João Ataíde “um ano inesquecível. Aquele ano de 1975, a que eu chamo o ano da revolução, todos estávamos animados e um bocado iludidos com a esperança de que podíamos construir um país novo. Este período foi muito conturbado politicamente e só em 1976 estabilizámos. Houve alguma desilusão em relação à bondade da revolução e isso, praticamente, levou a que todos nós escolhêssemos percursos de políticos alternativos. Estou a falar da minha geração, hoje na casa dos sessenta anos, uma geração fortemente politizada. Apesar de alguns terem abandonado esses ideais não deixam de ter preocupação na cidadania e do espaço político”, conclui.
Após cumprir o serviço cívico como professor de ginástica (tinha já sido atleta de ginástica da Associação Académica de Coimbra), entra na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Decorria o ano de 1976. O curso, esse, não poderia ser outro. “Entre aquilo que queremos ser e o que podemos ser existe uma diferença muito grande. Apercebi-me na adolescência que o que iria seguir deveria estar no domínio do Direito porque o meu pai também era juiz e havia uma postura muito ética, no sentido de procurar ter sempre o comportamento adequado com as regras sociais e com a nossa genuína liberdade. Sabia que era no âmbito do Direito mas, o quê em concreto, não. Na altura eu tinha alguma reserva em seguir a magistratura porque era uma actividade muito exigente e muito fechada. Costumava dizer-se que a magistratura é um sacerdócio. Eu não acho que seja. É uma carreira muito interessante onde possamos dar o nosso contributo na aplicação e interpretação da lei. Tem que se ter algum talento e algum gosto por esse desempenho. Há uma grande diferença entre o curso de Direito de hoje e o de então…o da altura seguia o modelo dos últimos 40 anos, estudei até por algumas sebentas do meu pai. Foi, para mim, fascinante ter, por exemplo, o Direito constitucional com o Professor Gomes Canotilho ou a Ciência Política com o Professor Vital Moreira ou, igualmente fascinante, a Introdução ao Direito com o Professor Castanheira Neves”.
Terminada a licenciatura de Direito em 1982, inscreve-se na Ordem dos Advogados mas, confessa, “a vida boémia de estudante de Coimbra continuava muito presente e a certa altura tornou-se inconciliável”. Volvidos cerca de cinco meses enquanto estagiário aceita ocupar o lugar de representante do delegado procurador da República em Idanha-a-Nova. Em 1983 ingressa no Centro de Estudos Judiciários para fazer a carreira de magistratura. Decorridos dois anos em Lisboa, regressa a Coimbra já como juiz estagiário e ruma, posteriormente, até ao Porto onde foi colocado como juiz auxiliar, chegando ainda a Celorico da Beira onde foi juiz efectivo. Regressa a Aveiro e é nessa altura que lhe é atribuída uma nota de mérito. “Na altura, para um jovem com 31 anos, era quase inédito, era o chamado «bom com distinção» que normalmente só é alcançado depois de seis a dez anos de carreira. E essa nota de mérito permitiu-me partir em vantagem nos concursos”. Com essa vantagem concorre para círculo judicial da Figueira da Foz, para presidente do Tribunal Colectivo. Por lá fica de 1991 até 2002, altura em que é convidado para o cargo de Director Nacional Adjunto da Policia
Judiciária na directoria de Coimbra e, depois, na do Porto. Em Outubro de 2005 entra no Tribunal da Relação de Coimbra como Juiz Desembargador, cargo que ocupou durante quatro anos estando, actualmente, em licença sem vencimento. “A magistratura, não sendo um sacerdócio, tem as suas limitações, ficamos um pouco circunscritos à nossa actividade e podemos ter uma participação cívica mas que não coloque em causa a nossa imparcialidade. É um conceito que tem de se respeitar e vem na constituição mas isso entrava em conflito comigo por me impedir de ter uma cidadania plena”.
O nome de João Ataíde surge, então, como candidato à Câmara Municipal da Figueira da Foz. “Assumi as funções de presidente da autarquia em novembro de 2009. Uma autarquia com graves problemas, com muitas dificuldades. Vínhamos de um período de muito à vontade…o mesmo à vontade com que eu andava na vida assim andaram alguns políticos durante algum tempo. Houve necessidade de se entrar com um plano de saneamento financeiro rapidamente e, a elaborar e a aplicar demorou cerca de um ano e pouco. Existiram muitas dificuldades inerentes a esse período. Foi o maior desafio que tive na vida”.
Nos últimos cinco anos foi Presidente da Comunidade Intermunicipal da Região de Coimbra. Foi também Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Incubadora de Empresas da Figueira da Foz, da Associação de Arbitragem de Conflitos de Consumo, da Administração do Porto da Figueira da Foz e da Estruturas e Investimentos do Mondego SA. E, por inerência da função exercida na autarquia, Presidente do Conselho de Administração da empresa municipal Figueira Parques. Actualmente faz parte do conselho Geral da Universidade de Coimbra e não deixa de estar presente nos fóruns
cívicos do círculo eleitoral.”
Hoje, com 61 anos de vida, 38 dos quais de serviço público, alia a vasta experiência na área do Direito ao mais recente cargo para o qual foi eleito, o de deputado do PS pelo círculo eleitoral de Coimbra. E acredita que o ciclo está fechado. “Agora é o que a vida me quiser dar mais”.
“Não excluí de forma irreversível a candidatura à Câmara Municipal da Figueira da Foz. Tive de tomar uma posição e fi-lo com grande risco pessoal porque podia provocar uma desconsideração absoluta nos meus pares por estar a seguir uma carreira política, e podia ter ónus pessoais para mim, porque se perdesse as eleições teria de regressar à magistratura de forma envergonhada. Aceitei o desafio e empenhei-me muito, pelo PS, que já na altura preenchia a minha matriz humanista, como homem aberto a esta forma social liberal de encarar o mundo, como eu costumo dizer, nas políticas públicas com cariz social, nos aspectos económicos e financeiros com carácter mais liberal. Claro, sem que o Estado deixe de ter uma posição naquilo que são os sectores primários da economia, ou de grande impacto.”
“Não sou militante mas sou simpatizante do PS. Bati-me nalguns projectos, empenhei-me na defesa de muitas ambições da região, tive uma leitura clara de todo o círculo eleitoral de Coimbra. Tudo isto deu-me alguma maturidade política. Acabei depois por ter o convite do ministro do ambiente para assumir a pasta de secretario de estado do ambiente o que espantou. Bem, era a pasta que estava em aberto… e depois pensei…de facto ordenamento do território, não me é estranho, a questão da preservação das políticas ambientais não me são estranhas, as alterações climáticas, o ruído ambiente, a qualidade do ar…bem, afinal nada me era estranho. Empenhei-me na discussão do Plano Director Municipal. Fiz a minha formação com os técnicos do ambiente e não só. Portanto, afinal, eu estava preparado por natureza.”
“Fiz cinquenta mil quilómetros em quatro meses a falar com os autarcas e a desafiá-los para estes quatro dossiês: ciclo urbano da água, resíduos, ruído ambiente e qualidade do ar. Entretanto, o Primeiro Ministro, António Costa, convidou-me para ser candidato pelo círculo eleitoral de Coimbra e eu, naturalmente, aceitei. Porque nesta questão de desempenho político temos de estar disponíveis. A minha postura é de grande disponibilidade. Assim como aceitei ser Secretário de Estado do Ambiente também aceitei ser Deputado. Era um desígnio, porque eu sempre quis ser deputado, mas por eleição directa, e, portanto, permitiu-me regressar ao meu meio e interpretar as leis, mas agora com experiência profissional capaz de me ajudar a desempenhar o cargo.”
“O Deputado representa o país. Eu estou na primeira comissão, Direito, Liberdades e Garantias, na terceira comissão que é a Defesa e estou também na como suplente na Comissão do Ambiente. A nossa participação directa é no âmbito das comissões, aquilo que nos pedem mais é estar atentos às matérias que nos foram concedidas, mas temos de acompanhar a actividade política do nosso circulo eleitoral. E é isso que pretendo fazer e por isso às segundas-feiras tenho um espaço disponível para acolher as pessoas que tenham projectos ou problemas a ver com este domínio legislativo e com o
papel da Assembleia da República. O que nos permite também fazer recomendações e projectos de resolução que podem ser apresentados ao governo. Pretendemos, eu e os meus colegas do partido, cumprir o programa eleitoral do PS.”